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Governo anuncia retomada da desintrusão da TI Apyterewa após carta do povo Parakanã e alerta de servidores públicos

Garimpo ilegal na TI Apyterewa
02/10/2023, Área de garimpo dentro da Terra Indígena Trincheira Bacajá, município de Altamira, no Pará. Foto: PF/Ascom

Publicado por Opi

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Nota das associações de servidores do Ibama e da Funai reforçaram riscos de paralisação da operação de retirada dos invasores

O governo federal anunciou hoje (9/11) a retomada das ações de desintrusão da Terra Indígena Apyterewa, entre São Félix do Xingu e Altamira, no Pará. A ação tinha sido paralisada, de acordo com a imprensa, por ordens do Ministério da Justiça. Após a paralisação, vários alertas foram enviados ao governo sobre o perigo de ceder às pressões dos invasores da área, que é a mais desmatada e mais invadida do país. As ministras dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara e do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, defenderam, dentro do governo, a continuidade da retirada de invasores.

Houve manifestações do povo Parakanã, que tem o usufruto exclusivo do território, das associações de servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Em manifestação enviada à Justiça Federal de Redenção (PA), o Ministério Público Federal (MPF) pediu que o governo fosse intimado a informar, de maneira clara e direta, sobre declarações do ministro da Justiça, Flávio Dino em entrevista à jornalista Míriam Leitão na emissora Globonews, no dia 1 de novembro. Na ocasião, o ministro afirmou que a operação de retirada dos invasores estava suspensa após a morte de um ocupante ilegal da área. 

Ao mesmo tempo, segundo documento do MPF enviado à Justiça, o Ministério dos Povos Indígenas emitiu um boletim no dia 3 de novembro afirmando que a desintrusão não tinha sido paralisada. Para o MPF, “a União adota uma posição ambígua, segundo a qual a desintrusão estaria em andamento, porém, sem o imprescindível apoio das forças de segurança pública”. 

A situação, diz o documento, configura um “descumprimento velado da decisão judicial, na medida em que, apesar de se negar formalmente a existência de suspensão no relatório, retira-se a estrutura material necessária para o andamento da desintrusão”. Hoje (9/11), a Justiça Federal de Redenção intimou a Advocacia Geral da União (AGU), a Casa Civil da Presidência da República e o Ministério da Justiça a responderem, em cinco dias, sobre a manifestação do MPF. 

Em carta do dia 7 de novembro, a Associação Tato’a, do povo Parakanã, apontou o risco de retrocessos com a retirada da Força Nacional da área da TI Apyterewa. A Associação alertou que, se as forças policiais não voltassem a atuar, os avanços alcançados pelos órgãos públicos seriam revertidos. Os indígenas afirmaram que já há indícios do retorno de rebanhos ilegais e de invasores que tinham saído voluntariamente na primeira etapa da operação. 

“O povo Parakanã, que há décadas testemunha e sofre violações contra o seu modo de vida, a integridade do seu território e, por consequência, a sua própria sobrevivência, não suportará mais retrocessos e omissões. Os mapas do avanço do desmatamento sobre o nosso território ilustram de forma irrefutável que, não sendo os invasores urgentemente retirados e permanentemente contidos de reingressarem na área, seremos dizimados. A água que consumimos está contaminada pelas atividades de garimpo, o ar que respiramos está carregado das cinzas do desmatamento desenfreado, e a caça, como base da nossa alimentação, tem sido deslocada ou dizimada pelo avanço das pastagens”, dizem na carta.

O temor pela saída das forças de segurança também foi expresso em nota das associações de servidores do Ibama (Ascema) e da Funai (INA), que afirmou que os funcionários públicos foram postos em risco na terra indígena Apyterewa porque seguiram cumprindo a determinação judicial de retirada dos invasores, mas sem suporte dos agentes da Força Nacional. “A medida, alegada como estratégia para evitar excessos e o agravamento de conflitos, tem tido efeito contrário e, na prática, tem impedido o avanço operacional, ao passo que restringe a realização das ações positivas de governo, justamente aquelas que podem auxiliar no apaziguamento dos ânimos e auxílio às populações de baixa renda”, diz o documento. 

Em nota no mês passado, no começo da operação de desintrusão, o Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi) já havia se manifestado contra a pressão de políticos paraenses que tentavam paralisar a retirada dos invasores. O Opi lembra que a retirada das quadrilhas de invasores que assolam a Apyterewa ocorre em cumprimento a ordens judiciais tanto do Supremo Tribunal Federal (STF) quanto da Justiça Federal de Redenção e é também uma dívida histórica do estado brasileiro com o povo Parakanã, que ouve promessas da desintrusão de suas terras desde o licenciamento da usina hidrelétrica de Belo Monte, um dos principais fatores para as invasões criminosas que tornaram essa a terra indígena mais desmatada do Brasil. 

A paralisação da operação não só desobedeceria ordens da Justiça Federal e do STF, mas também enviaria um perigoso sinal para grileiros, garimpeiros, pecuaristas e madeireiros que invadem terras indígenas em todo o país: a mensagem de que seus crimes não serão combatidos pelo poder público, mesmo com a eleição de um governo federal que publicamente se compromete com a preservação da Amazônia e com a defesa dos direitos indígenas.  

Veja a carta da Associação Tato’a do povo Parakanã

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