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Seis meses não são suficientes para proteger indígenas isolados

Foto: Bruno Jorge / Filme "Piripkura" / Zeza Filmes
Foto: Bruno Jorge / Filme "Piripkura" / Zeza Filmes

Publicado por Opi

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Por Priscilla Oliveira, pesquisadora e ativista da organização Survival International

Desde setembro de 2021, a Fundação Nacional do Índio (Funai) vem renovando as portarias de restrição de uso de terras indígenas com a presença de isolados por apenas seis meses – período insuficiente para a proteção dos territórios. 

O caso mais recente é o da Terra Indígena Piripkura (MT), cuja portaria foi renovada no último dia 04. Apesar da renovação, o território continua ameaçado já que nenhuma ação de desintrusão ou de proteção permanente foi realizada no período anterior. 

O mesmo aconteceu com as Terras Indígenas Pirititi (RR) e Ituna-Itatá (PA), que também tiveram seus mecanismos de proteção renovados por somente seis meses. 

As restrições de uso são instrumentos legais temporários que protegem territórios de indígenas isolados que ainda não foram demarcados. Elas proíbem a entrada de pessoas não autorizadas, a ocupação e a utilização comercial dessas terras.

As portarias são necessárias para preservar a integridade dos indígenas, que se refugiaram e não mantêm contato regular ou significativo com a sociedade envolvente por terem sofrido massacres e invasões.

Anteriormente, as portarias duravam de dois a três anos, o que permitia um tempo hábil para a realização de operações de proteção e fiscalização. E o que a Funai conseguiu fazer nos seis meses de duração das últimas renovações? A resposta é simples: nada. 

Desde o ano passado, quando foi renovada a restrição de uso da Terra Indígena Piripkura, nenhuma ação de fiscalização foi feita. Com isso, invasores receberam sinal verde para seguir ocupando ilegalmente o território. Ao todo, mais de 12 mil hectares da área já foram desmatados pela grilagem.

Análises de satélite do Instituto Socioambiental (ISA) mostram que frequentemente há um salto do desmatamento no período anterior ao vencimento das portarias. Ou seja, a destruição aumenta pela expectativa de que essas áreas sejam abertas para exploração. 

Os interessados se antecipam cadastrando processos minerários na Agência Nacional de Mineração (ANM) e registrando áreas griladas no Cadastro Ambiental Rural (CAR).  Exemplo disso são dois processos minerários para explorar recursos naturais na Terra Indígena Ituna-Itatá e a cobertura de 93,8% por CARs do território da terra Pirititi.

Comprovadamente, a aplicação de portarias de restrição de uso com um tempo tão reduzido enfraquece a proteção territorial das terras e fragiliza o próprio instrumento legal, que deveria permanecer vigente enquanto se concluem estudos multidisciplinares de natureza etno-histórica, antropológica, ambiental e cartográfica – até a finalização do processo de demarcação territorial. 

Preocupadas com o atual cenário, as Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), o Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Isolados e de Recente Contato (Opi), a Survival International e outras organizações criaram em 2021 a campanha “Isolados ou Dizimados” para exigir que a Funai retome sua missão institucional e garanta a integridade dos indígenas. 

Seis meses não são suficientes. Os povos indígenas isolados do Brasil devem ser protegidos e terem seus direitos à terra reconhecidos antes que eles, juntamente com as florestas das quais dependem, sejam dizimados.

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