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No aniversário de Bruno Pereira, Opi, Coiab e Opan lançam plataforma para monitoramento dos povos indígenas isolados

Mapa interativo do Mopi permite acessar dados sobre a vulnerabilidade dos povos isolados.
O mapa interativo do Mopi permite acessar dados sobre a vulnerabilidade dos povos indígenas isolados.

Publicado por Opi

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Ferramenta oferece informações de bancos de dados públicos e de levantamentos do Opi sobre as vulnerabilidades que afetam as vidas e os territórios dos grupos em isolamento na Amazônia brasileira

Mapa interativo do Mopi permite acessar dados sobre a vulnerabilidade dos povos isolados.
O mapa interativo do Mopi permite acessar dados sobre a vulnerabilidade dos povos indígenas isolados.

Neste dia 15 de agosto Bruno Pereira completaria 42 anos, se não tivesse sido brutalmente assassinado no Vale do Javari em junho de 2022. Em homenagem a ele e honrando o trabalho ao qual dedicou a vida, o Observatório dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi), organização que Bruno fundou em 2020, lança hoje uma plataforma de monitoramento dos povos isolados da Amazônia brasileira. A ferramenta reúne informações de bancos de dados públicos e de levantamentos de campo das redes do Observatório. Combinadas, essas informações permitem analisar as condições de vida e dos territórios desses grupos. A iniciativa é uma colaboração do Opi com a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e com a Operação Amazônia Nativa (Opan). Bruno Pereira foi um dos idealizadores da plataforma e integrou o núcleo técnico desde o início.

Clique para conhecer a plataforma Mopi

A plataforma foi batizada de Mopi, palavra que, no idioma zo’é, pode ser traduzida como “fazer ferroar”. Derivado do termo opi – expressão da mesma língua para ferroada e palavra wayana para planta-medicina -, Mopi é também o apelido da plataforma de Monitoramento dos Povos Indígenas Isolados, que apresenta ao público um abrangente conjunto de dados sobre as ameaças e pressões que incidem sobre os grupos que vivem em isolamento no país. Como o Opi – medicina para os parentes e veneno para os inimigos – o Mopi nasce para com duplo propósito de ferroar e curar. 

O Mopi é uma plataforma geoespacial, tendo como recorte principal os 114 registros de povos isolados reconhecidos pelo estado brasileiro – através da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) –  mais um registro que foi confirmado em 2021 mas não foi reconhecido pela gestão anti-indígena do governo Bolsonaro, de um grupo em isolamento vivendo na região do Mamoriá, no sul do Amazonas. Voltada ao monitoramento da situação de vulnerabilidade vivenciada por povos indígenas isolados, a ferramenta mapeia, portanto, 115 registros visualizados a partir de um mapa interativo. As localizações dos registros aparecem com as coordenadas deslocadas, propositalmente, para evitar a identificação exata dos territórios desses povos, pelo risco de ataques contra eles.  

Navegue pelo mapa interativo do Mopi

Ao compilar essas informações, o Mopi pode contribuir com a divulgação de dados a respeito da situação de vulnerabilidade vivenciada por esses povos, fornecendo subsídios para o trabalho de organizações indígenas, indigenistas e órgãos públicos voltadas à defesa de direitos e proteção das vidas dos isolados. Os dados foram cuidadosamente selecionados pelo núcleo técnico da plataforma, que é constituído por pesquisadoras e pesquisadores indigenistas especializados em áreas de conhecimento como etnologia indígena, direitos humanos, geoprocessamento, saúde, ecologia e tecnologia da informação. 

A construção de uma metodologia de monitoramento é o objetivo principal do núcleo técnico, que tem se dedicado à definição de diretrizes para o levantamento, tratamento e sistematização de informações a respeito da situação de vulnerabilidade enfrentada pelos povos isolados. Em aprimoramento constante, esta metodologia procura assegurar a confiabilidade dos dados levantados e conferir comparabilidade aos contextos monitorados.

Vulnerabilidade socioambiental

A avaliação da situação vivenciada pelos povos indígenas isolados tem como base o arcabouço teórico-metodológico de vulnerabilidade proposto pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC) da Organização das Nações Unidas. Adaptado para a análise da vulnerabilidade ambiental de Terras Indígenas da Amazônia Legal pela pesquisadora Ana Rorato, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o arcabouço apresenta diretrizes para o estudo de sistemas socioambientais suscetíveis aos impactos das mudanças climáticas. 

Pela metodologia, o conceito de vulnerabilidade é concebido como “o grau em que um sistema [humano, ambiental ou humano-ambiental] é suscetível a, ou incapaz de lidar, com efeitos adversos de mudanças”. Assim, espera-se que um sistema seja mais vulnerável se estiver exposto a ameaças, se for sensível a elas, e se possuir baixa capacidade de resposta para lidar com as mesmas e seus impactos. A abordagem foi adaptada pelo núcleo técnico da Plataforma Mopi para analisar indicadores diversos para demonstrar a exposição, a sensibilidade e a resiliência dos registros de povos isolados. 

Indicadores

Os dados relativos às ameaças e pressões são mapeados e organizados pela equipe do Mopi com atenção a várias dimensões, cada uma associada a um conjunto de informações temáticas que descrevem os múltiplos fatores e processos que influenciam a situação de vulnerabilidade dos povos isolados. 

Conheça as dimensões observáveis no Mopi:

Território

A dimensão fundiária considera dados relativos à situação territorial do registro de presença de povo indígena isolado. Nesta dimensão, compilamos dados sobre a etapa do processo de regularização da Terra Indígena, bem como sobre a presença de Unidades de Conservação, Projetos de Assentamento, Territórios Quilombolas, Imóveis Rurais Certificados e Cadastros Ambientais Rurais sobrepostas à sua área de ocupação e à sua área de entorno. Os dados reunidos nesta dimensão são secundários, disponibilizados por órgãos públicos.

Empreendimentos

A dimensão empreendimentos reúne dados relativos à presença de hidrelétricas, linhas de transmissão, ferrovias, rodovias, dutovias e processos minerários nas áreas de ocupação e entorno dos registros de povos indígenas isolados. Os dados compilados nesta dimensão são secundários, disponibilizados por órgãos públicos.

Meio-ambiente

Na dimensão meio-ambiente, compilamos dados relativos ao desmatamento, degradação e integridade florestal, cicatriz de fogo e focos de calor na área de ocupação e na área de entorno do registro. Dados relativos ao garimpo ilegal também foram considerados nesta dimensão. Os dados que compõem os indicadores de desmatamento, degradação florestal, focos de calor e integridade florestal são disponibilizados periodicamente pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Os dados relativos à área queimada, por seu turno, são um produto do sensor Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer (MODIS), ao passo que aqueles relativos ao garimpo ilícito foram obtidos no sítio da Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG).

Invasões

Na dimensão invasões, compilamos dados relativos à presença de atividade madeireira, caça, pesca e/ou coleta ilegais, garimpo, narcotráfico e missionários na área de ocupação do registro. Com base no direito ao usufruto exclusivo das TIs garantido aos povos indígenas pela Constituição, todas essas atividades foram consideradas invasões quando realizadas nas TIs sem anuência dos povos que elas ocupam. Os dados que compõem os indicadores desta dimensão foram levantados e sistematizados pelo núcleo técnico do Mopi através de nossas redes regionais.

Governança

A dimensão governança considera dados relativos às ações de monitoramento, proteção e vigilância realizadas pelas Frentes de Proteção Etnoambientais, a disponibilidade de estrutura física e de recursos humanos e a presença de organizações indígenas nas áreas de ocupação dos registros de povos indígenas em isolamento. Os dados que compõem os indicadores desta dimensão foram obtidos junto à Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (CGIIRC/FUNAI) através da Lei de Acesso à Informação. Os dados a respeito da presença de organizações indígenas e indigenistas nos territórios ocupados por isolados, por seu turno, foram levantadas e sistematizadas pelo núcleo técnico do <i>Mopi</i> através de nossas redes regionais.

Saúde

Na dimensão saúde compilamos dados a respeito dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) e Pólos-Base (PBs) responsáveis pela atenção em saúde nas áreas de ocupação e entorno dos registros de povos indígenas isolados monitorados, bem como dados sobre as Equipes Multidisciplinares de Saúde Indígena (EMSIs) que trabalham nessas regiões e sobre a disponibilidade de Planos de Contingência para Situações de Contato. Os dados que compõem os indicadores desta dimensão foram obtidos junto à Secretaria Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde (SESAI/MS) através da Lei de Acesso à Informação.

Registros de povos isolados

Atualmente, 28 dos 114 registros de povos indígenas isolados têm sua existência confirmada pela Funai, que contabiliza 26 referências em estudo e 60 registros de informação. Apesar da constante revisão pelo trabalho de qualificação das Frentes de Proteção Etnoambiental, a lista oficial de registros não foi submetida a um reexame sistemático durante o desmonte da política indigenista promovido pelo governo Bolsonaro (2018-2022), motivo pelo qual encontra-se desatualizada.

A coleção inaugural da plataforma do Mopi traz a público um conjunto completo de dados temáticos a respeito das vulnerabilidades vivenciadas pelos registros de povos isolados reconhecidos pelo Estado brasileiro. Os esforços iniciais foram concentrados nos 28 registros confirmados a fim de difundir informações a respeito da situação das áreas que ocupam e de seu entorno. 

Além dos confirmados, foram incluídas 5 referências em estudo (Katawixi, Igarapé Ipiaçava/Ituna-Itatá, Baixo Jatapu/Oriente, Pitinga/Nhamundá-Mapuera, Karapawyana), grande parte das quais localizadas em Terras Indígenas com Portarias de Restrição de Uso ou em processo de regularização. A coleção considera também um registro de presença (Mamoriá) confirmado pela Frente de Proteção Etnoambiental Madeira-Purus em setembro de 2021, mas não oficialmente reconhecido pela Funai no governo Bolsonaro (2018-2022).

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