Juliana Oliveira Silva[1]
Rafael de Brito Marques[2]
O novo coronavírus, que já assolava diversas regiões do país chegou à Terra Indígena (TI) Vale do Javari, no sudoeste do Estado do Amazonas, fronteira entre Brasil e Peru. Território compartilhado pelos povos Matis, Matsés, Marubo, Kanamari, Korubo, Kulina-pano, Tyohom-dyapá e povos isolados.[3] Com um histórico epidemiológico alarmante, a TI Vale do Javari é considerada uma das regiões mais vulneráveis diante da covid-19 devido a fatores como a distância em relação às unidades hospitalares de média-alta complexidade, o elevado contingente de povos isolados, o reduzido contingente de pessoas com mais de 60 anos[4] e a persistente presença de invasores.
Desde o mês de maio registram-se casos da covid-19 em pessoas Matsés, Matis, Marubo e Korubo contaminadas em cidades onde realizavam tratamentos de saúde, fora dos limites da terra indígena, com registro de óbito de uma mulher Matsés causado pelo novo coronavírus em Manaus (AM). No mês de junho, o novo coronavírus entrou nas aldeias da TI Vale do Javari. Em nota, no dia 04 de junho, o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Vale do Javari informou que quatro profissionais de saúde testaram positivo para o novo coronavírus dentro da aldeia São Luiz do povo Kanamari no médio rio Javari, onde ocorria um surto de malária – uma das 10 aldeias que integram o pólo-base Médio Javari com mais de 1.000 pessoas dos povos Matsés, Kanamari e Kulina.
A partir do foco de contaminação inicial, a covid-19 se espalhou entre profissionais de saúde com destino a outro pólo-base, o Médio Curuçá, e entre aldeias Matsés e Kulina nos rios Javari e Curuçá por onde estiveram os profissionais de saúde infectados antes da confirmação dos testes e da retirada da equipe de área. Ao saberem da contaminação, famílias atendidas pelo referido pólo-base adentraram na floresta para protegerem-se do vírus, mesmo sem recursos para caça e pesca.[5] Em ofício no dia 05 de junho, a Associação dos Kanamari do Vale do Javari (AKAVAJA) informou que havia 15 casos da covid-19 em monitoramento na aldeia São Luiz, cinco famílias com suspeita de contaminação e apenas 60 testes rápidos para uma população de 244 pessoas.
A existência de um acordo interinstitucional entre a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), acerca da realização das quarentenas dentro da TI Vale do Javari, não impediu que o DSEI Vale do Javari enviasse profissionais de saúde que cumpriram quarentena em perímetros urbanos com registro de casos da covid-19 para diferentes áreas da TI, inclusive, para atendimento aos Korubo no rio Ituí. Postura considerada por especialistas no tema e pelo Ministério Público Federal (MPF) como “negligência” aos riscos epidemiológicos envolvidos. Em nota, a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (UNIVAJA) pediu socorro às sociedades brasileira e internacional.[6]
O anúncio de finalização da construção de uma casa de quarentena no rio Quixito veio após a contaminação das aldeias no Médio Javari. As associações, o movimento indígena e o MPF destacaram a ineficácia das quarentenas realizadas em perímetros urbanos; a negativa rotatividade dos profissionais de saúde na TI; a falta de articulação e transparência nas informações repassadas pelo DSEI Vale do Javari sobre o número de infectados pela covid-19; a deficiência na fiscalização e a constante presença de invasores na TI; a inexistência de medicamentos, equipamentos e materiais de higienização; a insuficiência dos testes rápidos para diagnóstico da covid-19 e sua grande margem de erro; a necessidade de construção das barreiras sanitárias.
Preocupados com os povos de contato recente e isolados diante da chegada do novo coronavírus na TI, as associações e o movimento indígena solicitaram informações atualizadas sobre a situação da aldeia Jarinal, onde residem os Kanamari e os Tyohom-dyapá de recente contato. Várias Frentes de Proteção Etnoambiental (FPE) elaboraram planos de contingência para contextos díspares. No caso da TI Vale do Javari, a FPE não elaborou planos específicos para os povos de contato recente, apenas colaborou em outras iniciativas. Um plano de ação para a TI Vale do Javari foi elaborado pela UNIVAJA; e um plano de contingência foi construído pelo DSEI Vale do Javari com participação reivindicada pela FPE Vale do Javari e pela Coordenação Regional da FUNAI.
Considerando a reiterada vulnerabilidade epidemiológica dos povos indígenas isolados e de recente contato, com base em pesquisas de campo realizadas em 2019-2020, relataremos aqui algumas particularidades dos Korubo e Tyohom-dyapá, povos de recente contato da TI Vale do Javari, em diálogo com os planos de contingência existentes, a fim de contribuir com o planejamento de estratégias e ações para seguridade sanitária desses dois povos. Ambos estão no nível de resposta “alerta”, sem registro de casos da covid-19 em suas aldeias, porém, sob a iminência do extermínio com a chegada do novo coronavírus na TI Vale do Javari.
Os Korubo
Os Korubo pertencem ao ramo setentrional da família linguística pano e habitam um território nos limites da atual Terra Indígena Vale do Javari, onde há uma parcela de contato recente e outra em isolamento. Hoje, os subgrupos Korubo contatados pela FUNAI em 1996, 2014, 2015 e 2019 constituem uma população de 126 pessoas: 91 delas em quatro aldeias no baixo curso do rio Ituí, próximas à Base de Proteção Etnoambiental (BAPE/FUNAI) na confluência dos rios Ituí-Itaquaí;[7] 34 pessoas localizadas no rio Coari; e uma criança que reside na Casa do Índio em Manaus (AM). Em geral, essa população é jovem, apenas cinco pessoas com idade aproximadamente acima dos 50 anos de idade.
Os recém-contatados dos rios Ituí e Coari são atendidos por equipes de saúde distintas, que não raro atuam incompletas. A equipe que atende aos Korubo do rio Coari compartilha um acampamento com a FUNAI abaixo da boca do igarapé Coarizinho, enquanto a equipe que atende aos Korubo do rio Ituí instala-se em uma Unidade Básica de Saúde Indígena (UBSI) construída pela SESAI na BAPE e realiza visitas periódicas às aldeias, com idas e vindas no mesmo dia. Eventualmente, a embarcação para o atendimento à saúde nas aldeias Korubo no rio Ituí era utilizada para translados ao rio Coari, com o objetivo de deslocar profissionais de saúde e transportar imunobiológicos. A frequência desses translados reduziu após um acidente fluvial em agosto/2019.
A estrutura da UBSI é composta por uma cozinha e os dormitórios da equipe de saúde, que utiliza uma pequena farmácia e um espaço planejado inicialmente para atividades educativas, o “Chapéu de Zinco”, como alojamento dos pacientes Korubo removidos para BAPE – ambos externos a UBSI. A UBSI carece de equipamentos para a realização de exames básicos e para a conservação de imunobiológicos. A equipe de saúde no rio Coari depara-se com limitações similares.
Os Korubo ainda padecem de doenças que refletem as mudanças nas condições sanitárias dos povos recém-contatados (Albertoni; Reis, 2017). De uma amostra de 135 ocorrências de sintomas e diagnósticos registrados entre 2019-2020 entre os Korubo do rio Ituí, envolvendo ou não remoções dos pacientes, destacam-se: 53,33% infecções respiratórias; 11,11% malária; 4,44% diarreia. Há ainda casos crônicos de osteoartrose e psoríase entre os Korubo do rio Ituí.
Entre os Korubo, a velocidade de disseminação do vírus da gripe (toxoe na língua korubo) é extremamente alta, espalhando-se rapidamente intra e inter-aldeias. No mês de julho/2019, duas aldeias do rio Ituí, cerca de 45 pessoas, griparam: a infecção viral começou na maior aldeia, Tankala Maë, e passou para a aldeia Vuku Maë através das visitas entre os Korubo. Em fevereiro/2020, as pessoas na BAPE surpreenderam-se com a chegada de uma embarcação repleta de Korubo: era a maior aldeia do rio Ituí descendo à BAPE com fortes sintomas de gripe em busca da equipe de saúde. Os Korubo não costumam sair das aldeias para tratamento de gripe, mas naquela ocasião a embarcação utilizada pela equipe de saúde nas visitas às aldeias Korubo do rio Ituí descera à Atalaia do Norte (AM) para reabastecimento de combustível, permanecendo na BAPE parte da equipe de saúde.
A incidência de malária em uma área endêmica como o Vale do Javari é um dos principais diagnósticos nas solicitações da SESAI para remoções dos pacientes Korubo para tratamento na BAPE, pois crianças e adultos de contato recente necessitam de acompanhamento na administração dos medicamentos para evitar reincidências dos casos de malária. A diarreia (piene) é outro sintoma motivador das saídas dos recém-contatados à BAPE em motor próprio, por vezes, devido aos déficits outrora existentes na radiofonia das aldeias Korubo no rio Ituí.
A covid-19 ainda não chegou às aldeias Korubo, mas a ameaça é iminente. Em abril/2020, após a chegada do novo coronavírus ao Brasil, um menino Korubo acompanhado pelo pai foram removidos pela SESAI para um hospital em Atalaia do Norte (AM) por causa de um acidente ofídico. Ao receberem alta, os dois Korubo foram diretamente conduzidos à BAPE sem a realização de quarentena no interior da TI. No mês de maio, profissionais de saúde que atendem aos Korubo do rio Ituí ingressaram na terra indígena após realização de quarentena em perímetros urbanos. Algo que contrariava o acordo interinstitucional já existente acerca da realização de quarentenas no interior da TI, gerando tensões e discordâncias entre FUNAI e SESAI, atitude considerada pelo MPF e por especialistas no tema como “negligência” aos riscos epidemiológicos.
De fato, os Korubo removidos estiveram muito perto da contaminação da covid-19. Quando já estavam na BAPE, descobriu-se que uma das profissionais de saúde de serviço no referido hospital testou positivo para o novo coronavírus. Por sorte, a criança e o pai não foram contaminados. Todavia, no final de maio/2020 outra criança Korubo não escapou da contaminação da covid-19 na Casa do Índio em Manaus (AM), local onde reside para tratamento, longe da sua família de origem, sob a responsabilidade do Estado brasileiro.
No contexto da pandemia da covid-19, as saídas dos Korubo das aldeias e da equipe de saúde da TI tornam-se grande preocupação quantos aos riscos de exposição a vetores de contaminação. O isolamento, enquanto principal medida de contingenciamento da covid-19, torna-se um grande desafio no caso Korubo, agravado pela frágil estrutura de atendimento à saúde.
A escassa infraestrutura e a insuficiência dos recursos necessários à manutenção das equipes de saúde em área e das diretrizes para intervenções sem a necessidade de remoções são fatores que forçam aos constantes deslocamentos da equipe e dos pacientes Korubo. A equipe de saúde acaba descendo às cidades Atalaia do Norte e Tabatinga (AM) para reabastecimentos, trocas de equipes e transporte de imunobiológicos, enquanto os Korubo de contato recente são removidos para tratamentos na BAPE e/ou para realização até mesmo de procedimentos de baixa complexidade na cidade.
Diante da necessidade de isolamento, os Korubo estão expostos a situações de contato diversas com agentes institucionais; povos vizinhos na TI Vale do Javari, sobretudo, aqueles com os quais compartilham calhas de rio; e a persistente presença de invasores, cuja presença a Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) não conseguiu coibir, a despeito da redução dos ataques e disparos dos invasores contra a BAPE desde a inauguração da Portaria nº882/2019/MJSP, atualizada em nº107/2020/MJSP para prorrogar a atuação da FNSP junto à FUNAI.
Outro aspecto que chama a atenção é o fato da UBSI e da equipe de saúde que atende aos Korubo do rio Ituí localizarem-se dentro da BAPE, dificultando um isolamento rigoroso, já que a farmácia e o alojamento improvisado para os pacientes situam-se fora das dependências da UBSI, sendo desafiadoras as tentativas de restringir a circulação dos pacientes Korubo em tratamento na BAPE.
A maior parte das saídas dos Korubo das aldeias no rio Ituí estritamente por motivos de saúde, solicitadas ou não pela SESAI, é com destino à BAPE: de pelo menos 68 deslocamentos registrados entre janeiro/2019 e fevereiro/2020, 54 foram para a BAPE, ou seja, mais de 70% (Silva, 2020). O que evidencia a relação de proximidade que os recém-contatados do rio Ituí têm com a BAPE. Com a entrada da covid-19 na TI, isso nos leva à reflexão sobre o nível de isolamento e seguridade sanitária da equipe de atendimento à saúde dos Korubo e dos pacientes removidos para a BAPE.
Antes da pandemia, a BAPE já vinha apresentando algumas fragilidades enquanto local de atendimento à saúde de um povo de contato recente: alvo dos disparos de invasores[8] e exposição a bactérias e vírus diversos, como o vírus rábico por mordedura de morcego que infectou duas mulheres Korubo em outubro/2019, com necessidade de remoção para sorovacinação em Tabatinga (AM). A covid-19 põe em evidência que a proteção etnoambiental implica necessariamente em trânsito e circulação contínuos de pessoas, local de apreensões, com grande contingente de profissionais de instituições diversas, que aumentará com a construção de barreiras sanitárias e locais de quarentena nas proximidades.
Considerando as fragilidades da atual estrutura, a logística de atendimento à saúde dos Korubo e partindo do pressuposto da execução dos planos de contingência elaborados para a TI Vale do Javari, convém destacar algumas estratégias e ações para reforçar a seguridade dos recém-contatados dos rios Ituí e Coari.
Segundo profissionais de saúde com experiência de trabalho junto a povos indígenas, a situação dos povos que ainda não possuem contaminação da covid-19 em suas aldeias, como os Korubo, requer um incentivo e investimento primordial na realização das quarentenas e barreiras sanitárias, evitando sempre que possível o contato com eles, inclusive, por parte dos agentes institucionais.
Incentivar e estimular o isolamento comunitário dos Korubo do rio Ituí consiste em dar um suporte à obtenção dos alimentos e, simultaneamente, reduzir o número de visitas da equipe de saúde a situações emergenciais em que esteja rigorosamente paramentada com Equipamentos de Proteção Individual (EPI); e manter o acompanhamento diário da situação sanitária dos Korubo via radiofonia, com o apoio e a mediação dos Korubo contatados em 1996, que já possuem maior acesso e compreensão dos códigos não-indígenas.
Embora ainda vivam da agricultura, caça, pesca e coleta, nos últimos anos ampliou-se o acesso dos Korubo do rio Ituí a objetos industrializados: inicialmente através de doações e trocas, posteriormente com a venda de artefatos e, atualmente, com a inserção dos homens do subgrupo contatado em 1996 em atividades remuneradas junto a FPE Vale do Javari/FUNAI.
Hoje, os Korubo do rio Ituí consomem materiais para otimização das atividades de caça, pesca e manutenção dos motores peque-peque: malhadeira, anzol, linha, canoa, munições para caçadas, óleo, graxa, palheta e combustível. Considerando a redução das possibilidades de aquisição monetária dos Korubo no contexto da pandemia, há uma necessidade de manutenção regular e readequação temporária do Regime de Circulação de Bens (RCB/FUNAI),[9] de forma que os prazos sejam revistos e os bens que eram trocados sejam doados para fomentar o isolamento comunitário dos Korubo do rio Ituí: ferramentas de metal, pilhas, lanternas, isqueiros, sabão (fundamental ao combate da covid-19), e também gasolina, óleo e graxa.
A prevenção da contaminação por covid-19 através da informação e do monitoramento da situação sanitária nas aldeias é outra estratégia. Sabe-se que o nível de acesso e compreensão dos recém-contatados sobre o mundo não-indígena difere de outros povos e que os Korubo não possuem Agente Indígena de Saúde (AIS) para monitoramento das síndromes gripais, conforme previsto no plano inicial do DSEI Vale do Javari. Portanto, é necessário um investimento e otimização na comunicação com os Korubo e com outros povos da TI com os quais eles mantêm contatos esporádicos, os Matis e os Marubo.
Na ausência de AIS, é fundamental o estabelecimento prévio e acordado de um horário para comunicação radiofônica diária entre as equipes de saúde e os Korubo do rio Ituí, e a reinstalação da internet na BAPE, desativada desde fevereiro/2020, para eventuais atendimentos de saúde remotos, telemedicina e compartilhamento de informações visuais com os Korubo do rio Ituí, como vídeos informativos sobre a covid-19.
Apesar de serem considerados por agentes institucionais diversos como “dependentes dos medicamentos não-indígenas” (Amorim; Conde, 2010, p. 378), os Korubo têm certa dificuldade para seguir as recomendações das equipes de saúde, como a feitura de um descampado nas aldeias para redução dos índices de acidentes ofídicos e casos de malária ou o uso contínuo dos produtos ortopédicos em casos de fraturas, para citar alguns exemplos. Na ausência de medicamentos e imunizações, as recomendações sanitárias são cruciais na prevenção da covid-19. Não obstante os esforços das equipes de saúde, a dificuldade dos Korubo em seguir algumas recomendações relaciona-se, muitas vezes, a não compreensão de determinados processos, sobretudo, das doenças não-indígenas. Algo que vai além das diferenças linguísticas.
A compreensão sobre o novo coronavírus é fundamental para incentivar o isolamento comunitário dos Korubo do rio Ituí. Por isso, com o apoio dos contatados em 1996 enquanto tradutores-mediadores, precisa-se de diálogos contínuos e elucidativos, articulados entre a FPE e o DSEI Vale do Javari, para as recomendações sanitárias adquirirem sentido em relação às concepções de mundo deles, ou seja, a compreensão dos processos pelos quais o novo coronavírus entra nos corpos, como a contaminação ocorre através da proximidade física e das superfícies de contato, com a utilização de exemplos concretos, como: eventuais encontros com invasores (pescadores e caçadores) que, estrategicamente, chegam a doar objetos aos Korubo (principalmente da aldeia Sentele Maë, mais próxima da BAPE e dos “furos”/atalhos conhecidos pelos invasores); situações em que os Korubo chamam ou vão de motor atrás dos Marubo que passam pelo rio Ituí, voltando das cidades para as aldeias, a fim de trocarem produtos da roça por alimentos industrializados. Uma vez compreendidos os processos, aumenta a propensão dos Korubo seguirem as recomendações sanitárias.
Quanto aos Korubo do rio Coari, recém-contatados em 2019, a manutenção dos protocolos de quarentena já existentes é o fundamental, pois os riscos de contaminação por covid-19 envolvidos no transporte de imunobiológicos nesse atual contexto são altíssimos. Seguindo o protocolo do Ministério da Saúde, a disponibilização de medicamento para tratamento de influenza poderia ser útil entre os recém-contatados do rio Coari.
Há que se considerar que, apesar do incentivo ao isolamento comunitário dos Korubo do rio Ituí, eventualmente eles buscarão o atendimento da equipe de saúde. Então, outra estratégia é reforçar o isolamento e a seguridade sanitária da equipe de saúde e dos recém-contatados, observando as motivações dos deslocamentos das equipes de saúde e dos Korubo do rio Ituí para reduzir a circulação e os riscos de contaminação. Exceto em casos graves e/ou da covid-19, as remoções dos Korubo do rio Ituí à BAPE para realização de outros tratamentos, como malária, é extremamente desaconselhada por profissionais de saúde no contexto da pandemia. Para desviar os Korubo da BAPE, garantindo algum nível de isolamento comunitário, e reforçar o isolamento da equipe de saúde o ideal é retirá-la da BAPE durante a pandemia, estabelecendo uma estrutura temporária de atendimento fora dela.
O recomendado pelo MPF é a utilização da Casa de Apoio já existente, localizada ao lado da Tankala Maë, maior aldeia Korubo no rio Ituí, conforme relatório técnico para perícia nº979/2020/MPF cadastrada pela 6ª Câmara de Coordenação e Revisão a respeito das medidas de proteção de povos indígenas isolados e de recente contato (Coutinho Jr., 2020a, p. 64). O uso contínuo da Casa de Apoio pelas instituições FUNAI e SESAI, de fato, é uma demanda dos Korubo do rio Ituí que antecede a pandemia, reiterada em diversas ocasiões, como a reunião do dia 13 de fevereiro de 2019, realizada em Atalaia do Norte (AM), entre o cacique Txitxopi Korubo, Takvan Vakwë Korubo, o atual coordenador do DSEI Vale do Javari e um servidor da FPE Vale do Javari.
No entanto, para viabilizar condições de trabalho à equipe de saúde são necessárias algumas implementações na Casa de Apoio, como: radiofonia para comunicação com as aldeias Korubo e a BAPE; baterias e painéis solares; construção de banheiro; manutenção nas telas e implantação de janelas; infraestrutura para a captação de água, sobretudo, neste segundo semestre do ano, época do verão amazônico. Há que se considerar ainda o fornecimento de materiais de caça e pesca para a obtenção alimentar da equipe de saúde e o translado dos medicamentos, insumos e equipamentos que estão na BAPE para a Casa de Apoio.
Para o atendimento dos Korubo do rio Ituí em possíveis casos da covid-19 é necessário o uso de dupla estrutura: tapiris de isolamento e oxigênio. O aconselhável é (i) a utilização dos tapiris de isolamento, construídos a no mínimo 50 metros das aldeias Korubo, para monitoramento por parte da equipe de saúde, isolando os Korubo de acordo com a gravidade dos sintomas – de modo que uma comunicação eficaz com eles os ajude a compreender que não devem se aproximar do enfermo sob o risco de contaminação; e (ii) a adaptação de uma estrutura básica de oxigênio no “Chapéu de Zinco” da BAPE, redário com concentradores e cilindros de oxigênio. Considerando o alto nível de contaminação nas cidades de Atalaia do Norte e Tabatinga (AM),[10] o recomendado é evitar ao máximo remoções para fora dos limites da terra indígena, exceto em casos graves onde haja necessidade de intubação ou quando equipamentos necessários não puderem ser deslocados à TI.
Registramos ainda que para reduzir os deslocamentos da equipe de saúde para a cidade é preciso adequar o volume de combustível ao tempo de permanência da equipe em área, com margem adicional para emergências, e a existência de equipamento para conservação de imunobiológicos na UBSI. Para reduzir os índices de remoções dos pacientes Korubo para a cidade é preciso, sobretudo, estrutura para realização de exames de baixa complexidade, como os diagnósticos por imagem, e insumos, equipamentos e medicamentos previstos no elenco nacional por meio da Portaria nº1.059/2015/MS e na relação nacional de medicamentos essenciais RENAME/2020. Os equipamentos devem conter testes para diagnóstico da covid-19 e equipamentos previstos nos planos de contingência, como EPI, cilindro e concentradores de oxigênio, oxímetro de pulso, materiais de higienização etc.
A instalação da equipe de saúde fora das aldeias Korubo no rio Ituí, a insuficiência dos recursos e das estruturas e a proximidade do perímetro urbano acentuam uma dinâmica de atendimento à saúde pautada na circulação. Por isso, reforço ainda outro aspecto presente nos planos de contingência: a meticulosa higienização. No caso Korubo, dos objetos que entram nas aldeias, como as latas de leite fornecidas pelo DSEI para uma criança da aldeia Sentele Maë, os itens previstos no RCB/FUNAI, ou ainda, as embarcações utilizadas nos atendimentos às aldeias, com as quais as crianças Korubo têm extrema proximidade: correndo para a beira e aproximando-se da embarcação quando a equipe chega e vai embora.
Garantir algum nível de isolamento e seguridade sanitária da equipe de saúde e, por conseguinte, dos Korubo é uma tarefa que requer colaboração interinstitucional FUNAI-SESAI, com a otimização de logísticas conjuntas e diálogos com os Korubo, envolvendo as equipes de saúde e parceiros conhecidos por eles, como os servidores da FPE Vale do Javari vinculados ao Programa Korubo (Portaria nº693/PRES/2019);[11] e o recrutamento de recursos humanos especializados, com experiência indigenista comprovada, dispostos a isolarem-se no mato com os Korubo quando necessário. Diante da pandemia da covid-19, o maior desafio no caso Korubo não é necessariamente a dificuldade para efetuar remoções, e sim a facilidade de acesso que consequentemente gera demasiada exposição a possíveis vetores de contaminação, ou seja, a dificuldade de isolamento.
Os Tyohom-dyapá
Os Tyohom-dyapá são um povo falante de uma língua pertencente à família linguística Katukina, assim como os Kanamari, com quem coabitam a aldeia Jarinal, no alto curso do rio Jutaí. Com a menor população da TI Vale do Javari com 43 pessoas,[12] nos últimos vinte anos, trocaram seu modo de vida na floresta para estabelecer residência com os Kanamari, e somados as 151 pessoas, constituem 194 pessoas na aldeia Jarinal.
Aldeia Jarinal (Foto: Rafael de Brito, janeiro/2020).
Desde então não houve um crescimento populacional expressivo. Pelo contrário, nos últimos anos têm enfrentado uma sequência de moléstias atribuídas aos Kariwá (brancos), que mesmo não estabelecendo contato direto com estes últimos, as doenças anteciparam o contato e foram responsáveis por sua queda demográfica. A partir de 1950 começaram a ter contatos mais sistemáticos com os Kanamari do rio Jutaí e com a população não-indígena da região. Como resultado das novas interações com não-indígenas surgiram as “doenças de catarro”.
Na língua Tyohom-dyapá, a palavra “tohna” pode ser traduzida como catarro. Dizem que muitos dos seus velhos morreram em decorrência de doenças descritas com sintomas de doenças infecto respiratórias, como febre e tosse com catarro. Uma ameaça invisível, assim como outras doenças dos Kariwá, responsável pela dizimação de parte de seus membros no período que antecedeu o contato permanente com a sociedade envolvente e nos anos seguintes.
Ainda hoje a taxa de mortalidade infantil é alta. Em levantamento realizado pelo Agente Indígena de Saúde na aldeia Jarinal, entre 2010 e 2015 houve uma média de uma morte por ano. Os Kanamari também apresentam um número elevado, no mesmo período morreram outras doze crianças (Clark; Gil, 2016).[13] Entre os óbitos infantis são recorrentes sintomas como febre, tosse com catarro e/ou diarreias agudas. As enfermidades mais frequentes entre os adultos são tuberculose, gripes, malária, hepatites e filariose. A situação de saúde da aldeia Jarinal pode ser considerada como de extrema vulnerabilidade.
A aldeia é bastante isolada geograficamente e o acesso à região é complexo e laborioso. Saindo do município de Eirunepé, os indígenas realizam suas viagens de regresso através dos varadouros na floresta e pelo rio. Os deslocamentos podem ter duração de até uma semana, a depender das condições dos varadouros e dos rios. A variação atende a sazonalidade da região, as duas estações bem definidas da Amazônia: chuva e seca. As dificuldades nos deslocamentos evidenciam a fragilidade destes povos e revelam a necessidade de um atendimento de saúde continuado.
Há pouco mais de três anos, após incessantes reivindicações dos Kanamari e Tyohom-dyapá e demais organizações indígenas por melhoria no atendimento da população do rio Jutaí, houve a implementação de um atendimento de saúde mais permanente por equipes da SESAI. As equipes de saúde realizam a entrada na terra indígena e permanecem de trinta a sessenta dias na aldeia, prestando serviços de atenção básica e primária.
Os atendimentos acontecem em uma casa construída com o apoio da FUNAI e conta com o alojamento para os profissionais de saúde e uma pequena farmácia. A medida tem garantido o atendimento de emergência para esta população e o tratamento de outras enfermidades. Em casos mais graves acontecem remoções por helicóptero, conduzidos ao município de Tabatinga (AM).
A ameaça da vez é a pandemia causada pelo novo coronavírus, que pode provocar uma verdadeira hecatombe para os Tyohom-dyapá em virtude do pequeno tamanho de sua população. Como outros grupos isolados e recém-contatados da Amazônia, os Tyohom-dyapá apresentam extrema vulnerabilidade diante de moléstias virais. Isso porque não possuem defesas imunológicas contra doenças trazidas por não-indígenas. Nesse sentido, é necessário medidas urgentes para conter a chegada do novo coronavírus na aldeia Jarinal e evitar uma verdadeira tragédia.
Desde que o novo coronavírus chegou ao continente tem preocupado as comunidades indígenas que já enfrentaram outras epidemias. Há inúmeros exemplos na história de como uma epidemia dizimou populações indígenas por completo. Durante a escrita deste texto fomos surpreendidos com quatro agentes de saúde que testaram positivo para o novo coronavírus e estavam prestando atendimento em área. Os agentes foram removidos da aldeia São Luiz, do povo Kanamari. A maior preocupação agora é que o vírus se espalhe por outras pessoas ou mesmo comece a circular entre outras aldeias.
As ações imediatas para conter as contaminações no rio Jutaí devem levar em conta as especificidades da região. A distância e a dificuldade na comunicação são sem dúvidas fatores complicadores. No início do ano corrente, os Kanamari e os Tyohom-dyapá estavam envolvidos na abertura de uma nova aldeia, que agora foi concretizada. Entre outras motivações, optaram pela abertura de uma nova aldeia que não formasse lamaçal e que não tivesse tantos piuns. A nova aldeia fica algumas voltas do rio Jutaí acima, um pouco mais distante e deixou para trás instalações de apoio e comunicação com a FUNAI e a SESAI. A aldeia antiga contava com um telefone orelhão avariado e um rádio transmissor.
Neste cenário a comunicação com a comunidade apresenta inconsistências, apesar de possuir o rádio, carece de outras formas de comunicação mais precisas em casos de urgência. O canal de comunicação pode ser decisivo na instrução à comunidade sobre como agir no atual momento. É necessário atualizar o canal de comunicação na nova aldeia. Apostar na compra de telefonia satelital ou comunicadores satelitais bidirecionais, que permitam comunicação em regiões remotas onde não há cobertura disponível.
Como em outras ocasiões, enfermidades que se agravam necessitam de imediata remoção. No entanto, são necessárias condições climáticas favoráveis ao voo. São vitais os procedimentos de isolamento dos pacientes e tratamento adequado antes do agravamento dos sintomas. Em muitos casos o uso de concentradores e cilindros de oxigênio podem ser decisivos para evitar óbitos, antecedendo a remoção, tendo em vista quadros agudos de crises respiratórias.
Assim, é necessária a construção de uma unidade de apoio para atender a aldeia Jarinal e a população Kanamari e Tyohom-dyapá. Aproveitando o ensejo da mudança para a nova localidade, a instalação da unidade de apoio poderá ter um papel decisivo no enfrentamento à pandemia. A unidade de apoio deve contar com estrutura que possibilite o atendimento na aldeia, reservando a remoção para a cidade em casos de maior complexidade com necessidade de intubação ou que equipamentos não possam ser deslocados à aldeia Jarinal.
As medidas propostas dizem respeito a cuidados para prevenção da contaminação e tratamento dos contagiados. Tendo em vista a situação precária do sistema de saúde da região, o melhor caminho é o isolamento comunitário nas aldeias, já que o município mais próximo da aldeia, Eirunepé (AM), não possui infraestrutura adequada para o acolhimento de indígenas e seus acompanhantes em situações de emergência médica. A casa de apoio da SESAI na sede deste município presta assistência a uma ampla variedade de povos indígenas da região, a bacia do rio Juruá desemboca em várias terras indígenas, de modo que não apresenta infraestrutura para abrigar os pacientes indígenas em trânsito.
O município de Eirunepé tem um terreno destinado para construção de uma casa de passagem para dar suporte ao atendimento da SESAI. No entanto, a prefeitura do município não iniciou as obras e o terreno foi tomado pelo mato alto e murado por tapumes. Antes da realidade pandêmica que nos encontramos, muitos indígenas acabavam por se instalar nas praças e nos arredores do município. Uma realidade que contraria todas as atuais recomendações de saúde.
Até a escrita deste relato não havia registros de contaminados na aldeia Jarinal. No entanto, o primeiro caso da TI Vale do Javari foi registrado no médio Javari. Tradicionalmente o povo Kanamari realiza visitas esporádicas às aldeias vizinhas, onde encontram alguns de seus familiares. Existe a preocupação com os casos assintomáticos. A preocupação é que seu padrão de mobilidade contribua na proliferação do novo coronavírus.
A propósito, são justamente os indivíduos assintomáticos que podem se transformar em principais vetores de contaminação. A disponibilidade dos testes nos municípios e nas aldeias pode evitar um crescente número de contágios. Mesmo sabendo da prioridade dos testes para aqueles que apresentarem sintomas, é importante insistir no isolamento dos mais idosos que possam ter contato com assintomáticos.
Eventualmente algum Kanamari de outro rio poderá realizar visitas às outras aldeias, entre elas a do rio Jutaí, ou mesmo os próprios Kanamari do rio Jutaí podem ir ao município para suprir a demanda de artigos em geral. Estes objetos podem apresentar um risco eminente para estes povos. A superfície desses objetos pode estar contaminada e, após sua circulação, aumentam as chances de contágio.
Doações de itens como cartuchos e pólvora para atividades de caça, linhas, redes e anzóis para pesca, além de isqueiro, sal, bem como outros gêneros alimentícios podem garantir a permanência das pessoas na aldeia. A entrega destes itens deve atender rigorosamente os protocolos sanitários. Uma vez que suas necessidades sejam supridas, é preciso averiguar a duração destes suprimentos.
É importante a construção de uma barreira sanitária na boca do rio Juruazinho, antes de adentrar o rio Jutaí, para conter o trânsito de não-indígenas pela região. A comunidade ribeirinha da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Cujubim também está em situação de vulnerabilidade diante da ameaça do novo coronavírus. Eventualmente realizam visitas à aldeia Jarinal quando estão de regresso após idas aos municípios, sobretudo, Jutaí e também Eirunepé. É essencial a realização de quarentena para os indivíduos que estão de regresso.
Há, ainda, uma grande preocupação com os invasores. Caçadores e garimpeiros frequentemente são vistos pela região, apesar da recente operação em 2019 da Polícia Federal em conjunto com a FUNAI e IBAMA para desarticular e expulsar esses invasores da área.[14] Os invasores são potenciais vetores de contaminação em virtude de seu trânsito entre a cidade e a floresta. Em um passado recente, garimpeiros aliciavam os moradores da aldeia Jarinal e faziam trocas recorrentes.
A presença destes invasores é estimulada por reiteradas declarações do chefe do Executivo. É notória a intenção de flexibilização dos limites territoriais. Na prática os invasores sentem-se desinibidos diante do alinhamento ao discurso do mandatário da república. O desrespeito aos limites da terra indígena preocupa as ações de combate à pandemia. É necessária uma fiscalização atuante, para que se possa coibir estes atos. Caso contrário a exposição a estes invasores pode aumentar os riscos de contágio.
O momento exige ações rápidas e o comprometimento em preservar a integridade física das comunidades. É preciso reforçar os canais de comunicação com as aldeias, alertar as comunidades da importância visceral do isolamento em suas aldeias. Para tanto, se faz necessária uma arrecadação e o envio de itens que os indígenas consideram importantes para garantir sua permanência na aldeia. Como ressaltado anteriormente, o combate à pandemia passa pela união de diversos setores da sociedade civil em conjunto com as ações de instituições governamentais. Somar estes esforços agora possibilita um futuro mais otimista para este povo.
Algumas considerações
A covid-19 que chegou no mês de junho às aldeias da TI Vale do Javari, com foco inicial na aldeia São Luiz do povo Kanamari, no médio rio Javari, ameaça diretamente todos os povos da TI, sobretudo, os isolados e de contato recente. A velocidade com que o novo coronavírus se alastra é acentuada pelas fragilidades do sistema de saúde indígena já vigente na região. A situação dos Korubo e dos Tyohom-dyapá certamente não pode ser resumida em poucas palavras, porém, os relatos aqui apresentados objetivaram lançar pistas sobre o cenário atual e possíveis estratégias e ações que podem contribuir com as instituições responsáveis para o reforço da seguridade sanitária desses dois povos.
As duas situações apresentam semelhanças e divergências. Em ambos os casos, as equipes de saúde usufruem das instalações físicas implantadas pela FUNAI para o atendimento à saúde dos povos de recente contato, possibilidade prevista na Portaria Conjunta nº4.094/2018 que define princípios, diretrizes e estratégias para a atenção à saúde dos povos indígenas isolados e de recente contato. Contudo, tais estruturas caracterizam-se basicamente por dormitórios das equipes e pequenas farmácias com escassez de insumos e medicamentos, por vezes, levando à necessidade de remoções para perímetros urbanos, onde os recém-contatados ficam expostos a diversos fatores que contrariam as atuais recomendações da Organização Mundial de Saúde. O caso da aldeia Jarinal acentua-se por ter recentemente mudado de lugar, deixando para trás essas instalações.
A ausência de unidades hospitalares de média-alta complexidade nos municípios Atalaia do Norte, Eirunepé e Tabatinga, no Estado do Amazonas, é outro agravante: locais onde ainda não há hospitais de campanha para atender os povos da TI Vale do Javari, muito menos para prestar a assistência necessária às peculiaridades dos povos de contato recente. É extremamente desaconselhável remover pacientes de contato recente para perímetros urbanos no contexto da pandemia, exceto em casos de extrema gravidade com necessidade de equipamentos que não possam serem deslocados à BAPE ou à aldeia Jarinal.
A ameaça persistente dos invasores – pescadores e caçadores no caso Korubo, garimpeiros e caçadores no caso Tyohom-dyapá – assombra essas duas pequenas populações da TI Vale do Javari, apesar da presença da Força Nacional de Segurança Pública na BAPE Ituí-Itaquaí e da operação que destruiu 60 balsas de garimpo ilegal próximo da aldeia Jarinal e da RDS Cujubim no mês de setembro/2019. Essa contínua presença dos invasores representa perigos reais de transmissão da covid-19 para os recém-contatados da TI.
A contínua exposição aos invasores, os contatos permanentes com outros povos da TI e agentes institucionais somados às circulações inter-aldeias alertam para as possibilidades de transmissão do novo coronavírus entre os Korubo e Tyohom-dyapá, com especial atenção aos objetos que entram nas aldeias. No caso Tyohom-dyapá somam-se ainda os contatos fortuitos com pessoas da RDS Cujubim que visitam a aldeia Jarinal quando retornam das cidades e os eventuais deslocamentos dos Kanamari ao município Eirunepé (AM) em busca de suprimentos para a aldeia.
Destaca-se a necessidade urgente de construção das barreiras sanitárias, dos protocolos rígidos de quarentena e o incentivo para que os recém-contatados isolem-se na floresta pelo máximo de tempo possível. Nos casos Korubo e Tyohom-dyapá é necessário ainda o estabelecimento de locais para isolamento de possíveis casos da covid-19 e a obtenção dos testes rápidos, considerando a velocidade das transmissões virais entre eles, a vulnerabilidade imunológica e o reduzido contingente populacional. É de fundamental importância que todos, indígenas e não-indígenas, sigam os protocolos construídos para realizações de quarentenas e higienizações dos insumos que chegam às aldeias da TI.
Se comparados a outros povos da TI Vale do Javari, os Korubo e os Tyohom-dyapá possuem baixa densidade demográfica e suas realidades divergem em alguns aspectos. Um deles é o histórico de contato: os agentes do contato e a implementação ou não dos procedimentos sanitários. No caso Korubo, os quatro momentos de contato foram operados pelo órgão indigenista oficial, enquanto no caso Tyohom-dyapá o contato fora realizado pelo povo Kanamari – o que se reflete no contraste presença-ausência dos órgãos estatais junto a esses dois povos.
Desde o contato do órgão indigenista oficial com o primeiro subgrupo em 1996, a população Korubo cresceu, porém, a estrutura de atendimento à saúde dos recém-contatados parece não ter acompanhado esse crescimento na mesma proporção. Enquanto entre os Tyohom-dyapá observa-se um tímido crescimento populacional marcado pela ausência da assistência básica à saúde que só recentemente chegou à aldeia Jarinal.
Se, por um lado, a radiofonia das aldeias Korubo no rio Ituí foi recentemente verificada pela FPE Vale do Javari; por outro, entre os Tyohom-dyapá verificam-se deficiências na interlocução expressas no sucateamento dos aparelhos de comunicação, como orelhão e rádio, inviabilizando o monitoramento das síndromes gripais e de possíveis casos da covid-19 entre a população da aldeia Jarinal que, após a mudança de local, conta agora apenas com o rádio.
A relativa proximidade do perímetro urbano, que facilita o acesso às aldeias Korubo do rio Ituí, convencionalizou um frágil esquema de atendimento à saúde pautado em circulações constantes das equipes e dos pacientes. Tal proximidade contrasta fortemente com a distância e a dificuldade de acesso à aldeia Jarinal dos Tyohom-dyapá e Kanamari, exceto para os garimpeiros e caçadores ilegais que continuam acessando a região. Há, portanto, a necessidade de aquisição de horas voo para remoções de urgência na aldeia Jarinal e a disponibilidade de concentradores e cilindros de oxigênio para os pacientes em risco.
Se na aldeia Jarinal atua o Agente Indígena de Saúde (AIS) Kanamari e a equipe de saúde instala-se dentro da aldeia, no caso Korubo a ausência de AIS e a instalação das equipes de saúde fora das aldeias, em BAPE ou acampamento, evidenciam a necessidade de otimização da comunicação com os Korubo do rio Ituí para um monitoramento eficaz da situação sanitária. Por um lado, a circulação dos Korubo para as cidades do entorno está atualmente restrita a remoções sanitárias solicitadas pela SESAI; por outro, os Tyohom-dyapá compartilham a comunidade com os Kanamari que, eventualmente, circularão para fora dos limites da TI em busca de mantimentos para a aldeia Jarinal. Diferentes entraves ao isolamento comunitário enquanto medida de prevenção e combate ao novo coronavírus.
A covid-19 aproxima-se dos dois povos com a ameaça de extermínio. Os Korubo, ao escaparem das contaminações no hospital de Atalaia do Norte (AM), não lograram a mesma sorte na Casa do Índio em Manaus (AM), com o registro de uma criança Korubo de cinco anos de idade contaminada pelo novo coronavírus. Os Tyohom-dyapá, ainda em estado de “alerta”, sofrem as pressões da covid-19 que já chegou nas aldeias Kanamari no médio rio Javari, impactando uma parcela do povo com o qual compartilham a aldeia Jarinal.
A TI Vale do Javari, com seus 8,5 milhões de hectares, tem um vasto histórico epidemiológico. Entre os anos 1960 e 2000 houve uma série de epidemias, por vezes combinadas, que foram encaradas pela população e pelo movimento indígena sob inúmeros óbitos. Desde os anos 1960 já havia casos de tuberculose e, no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, epidemias de gripe atingiram em cheio os Matis, um povo naquela época considerado de recente contato pelo órgão indigenista oficial.
Nos anos 1980, registraram-se casos de pneumonia, sarampo, tuberculose e doenças sexualmente transmissíveis. Em 1990, a epidemia de cólera ameaçava a região chegando pelos municípios do entorno e pela fronteira com o Peru. Ao longo dos anos 1990 interpuseram-se epidemias de cólera, malária, coqueluche e também hepatites virais que, a partir dos anos 2000, se tornaram o principal problema sanitário no Vale do Javari junto a doenças emergentes, como mansonelose e meningite.
Agora, em 2020, chegou à região o novo coronavírus, que distingue-se das epidemias já conhecidas por seu caráter pandêmico: a inexistência de medicamentos e imunizações em qualquer parte do mundo. Um vírus que tem abalado as estruturas dos sistemas de saúde, político e econômico, devastando principalmente as populações mais vulneráveis, como os povos indígenas. A covid-19 vem acentuar as fragilidades já existentes na estrutura de atendimento à saúde dos povos da TI Vale do Javari com antigos problemas, como a falta de testes para diagnósticos precisos, conforme ocorrera em relação às hepatites virais e agora volta a se repetir com o novo coronavírus. A escassez dos testes para diagnóstico da covid-19 já denunciada pelas organizações e movimento indígena, 60 testes para 244 moradores da aldeia São Luiz do povo Kanamari: um prenúncio cruel.
Viemos aqui alertar e pedir a ajuda das entidades e instituições responsáveis pela segurança física e sanitária desses dois povos de contato recente diante da pandemia do novo coronavírus. É necessário correr contra o tempo, pois a velocidade com que a covid-19 se alastra pode realmente exterminar os Korubo e os Tyohom-dyapá. Ao tornar pública a atual situação sanitária dos povos recém-contatados da TI Vale do Javari, queremos chamar a atenção da sociedade civil, das entidades e dos parceiros diversos: diante da covid-19, os povos de contato recente da TI Vale do Javari certamente estão sob o risco de extermínio.
Nota de agradecimento
Agradecemos ao Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato. Registramos ainda especial menção a Bruno da Cunha Araújo Pereira e a Lucas Infantozzi Albertoni por compartilharem conosco suas experiências de trabalho junto a povos indígenas isolados e de recente contato.
Fontes e referências
Albertoni, Lucas; Reis, Roberta. 2017. “Questões epidemiológicas e desafios no atendimento aos chamados povos isolados: uma experiência de contato com os Korubo”. In: Amazôn., Rev. Antropol. 9 (2): 808-831.
Amorim, Fabrício; Conde, Ananda. 2010. “Situações de contato e isolamento no Vale do Javari”. In: CEDI: Centro Ecumênico de Documentação e Informação. Povos Indígenas no Brasil-2006/2010.
Associação dos Kanamari do Vale do Javari. Ofício nº10/AKAVAKA/ATN/2020. Assunto: informações sobre casos positivos de covid-19 nas aldeias localizadas no Médio Javari, na Terra Indígena Vale do Javari-AM. 05/06/20.
Coutinho Jr., Walter. 2020a. “O contágio da covid-19 no Vale do Javari: uma situação de emergência em saúde indígena”. Relatório Técnico nº 112/2020-PGR/SPPEA/ANPA. 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal. SP 979/2020.
_____. 2020b. Informação nº001-PRG/SPPEA/ANPA. Referência: Procedimento Administrativo 1.00.000.006362/2020-19. Assunto: Emergência sanitária no DSEI Vale do Javari.
Recomendação nº05/2020/PRM/TABATINGA. Referência: Procedimento Administrativo de acompanhamento de Políticas Públicas nº 1.13.001.000032/2020-43. Assunto: Covid-19 (Coronavírus). Saúde Pública. Vigilância sanitária. Prevenção.
Silva, Juliana O. 2020. “O isolamento é possível? O caso de um povo de recente contato do Vale do Javari”. In: Cadernos de Campo – edição especial Covid-19 e os campos da antropologia. Universidade de São Paulo (no prelo).
Plano de Contingência Nacional para Infecção Humana pelo novo coronavírus (COVID-19) em Povos Indígenas.
Plano de Contingência do Distrito Sanitário Especial Indígena Alto Rio Juruá para Infecção Humana pelo novo coronavírus (COVID-19) em Povos Indígenas.
Plano de Contingência para Infecção Humana pelo novo coronavírus (COVID-19) da Terra Indígena Araribóia.
Plano de Contingência para Infecção Humana pelo novo coronavírus (COVID-19) para os indígenas de recente contato e isolados do povo Awa Guajá.
Plano de Contingência para prevenção e combate ao Covid-19 na Terra Indígena Zo’é.
Plano de Contingência do Distrito Sanitário Especial Indígena Vale do Javari para Infecção Humana pelo novo coronavírus (Covid-19).
Plano de ação para enfrentamento do COVID-19 na Terra Indígena Vale do Javari / União dos Povos Indígenas do Vale do Javari.
Plano emergencial para o combate e gestão dos riscos da covid-19 na Terra Indígena Vale do Javari / União dos Povos Indígenas do Vale do Javari.
Sociedade Brasileira de Medicina da Família e Comunidade. “Avaliação do grupo de interesse em saúde indígena da SBMFC sobre a situação da atenção aos povos indígenas frente a pandemia de covid-19”. 06/06/20.
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Imagem em destaque: Panorama da aldeia Jarinal, na TI Vale do Javari. Crédito: Rafael de Brito Marques, 2020.
[1] Doutoranda em Antropologia Social no Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atua junto aos Korubo da Terra Indígena Vale do Javari. E-mail: [email protected]
[2] Mestrando em Antropologia Social na Universidade de Brasília. Trabalha com os Tyohom-dyapá da Terra Indígena Vale do Javari. E-mail: [email protected]
[3] Conforme o órgão indigenista oficial, a TI Vale do Javari possui 16 registros de povos indígenas isolados. Destes, nove são confirmados; e dois povos são considerados de contato recente: os Korubo e os Tyohom-dyapá.
[4] Modelagem da vulnerabilidade dos povos indígenas no Brasil ao covid-19 (ISA/CSR-UFMG). Fonte: https://drive.google.com/file/d/1H596_oDmOGf4mOTziHGIrbYM17PdycVj/view. Acesso: 20/06/20.
[5] Famílias indígenas na TI Vale do Javari saem remando para o meio do mato, em fuga da pandemia. Fonte: https://deolhonosruralistas.com.br/2020/06/09/familias-indigenas-na-ti-vale-do-javari-saem-remando-para-o-meio-do-mato-em-fuga-da-pandemia/?fbclid=IwAR1A0S4EtAtibgK4Uz-RrUh-ZwEcS1smOeVdyMDE6Y_MkH_FQpdkdJKDOqo. Acesso 09/06/20.
[6] Nota da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari à sociedade brasileira e a comunidade internacional sobre o avanço do covid-19 na Terra Indígena Vale do Javari. Fonte: https://univaja.com/nota-sobre-o-avanco-do-covid-19-na-terra-indigena-vale-do-javari/. Acesso: 07/06/20.
[7] Atualmente, a FUNAI atua na TI com quatro Bases de Proteção Etnoambiental (BAPE) nos rios Curuçá, Jandiatuba, Quixito e na confluência dos rios Ituí-Itaquaí. Neste relato, a sigla “BAPE” fará referência àquela localizada na confluência dos rios Ituí-Itaquaí, cujo fluxo de pessoas geralmente envolve agentes de instituições diversas, colaboradores indígenas e outras pessoas entrando ou saindo da TI.
[8] Principal base da Funai para proteção de índios isolados sofre oitavo ataque em 12 meses. Fonte: https://g1.globo.com/politica/blog/matheus-leitao/post/2019/11/04/principal-base-da-funai-para-protecao-de-indios-isolados-do-pais-sofre-oitavo-ataque-em-12-meses.ghtml. Acesso: 04/11/19.
[9] Segundo o acordo, o Regime de Circulação de Bens serve para “padronizar as relações estabelecidas com os Korubo, com a FUNAI e demais profissionais envolvidos no trabalho com esse povo indígena, principalmente no que diz respeito a circulação (troca e venda) de bens produzidos por eles, assim como a introdução e demandas por bens industrializados em seu cotidiano, que introduzidos sem uma devida orientação pode causar danos a sua estrutura organizacional, assim como empobrecimento de sua cultura material, e outras conseqüências negativas.”
[10] Amazonas tem 12 cidades entre as 20 com maior incidências de casos de Covid-19 no Brasil. Fonte: https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2020/05/05/amazonas-tem-12-cidades-entre-as-20-com-maior-incidencias-de-casos-de-covid-19-no-brasil.ghtml. Acesso: 05/05/20.
[11] Fonte: http://www.funai.gov.br/arquivos/conteudo/ascom/2019/05-mai/PROGRAMA%20KORUBO.pdf. Acesso: 23/05/19.
[12] Existe uma parte não contabilizada do grupo Tyohom-dyapá em isolamento.
[13] Saúde e dinâmicas de ocupação territorial dos Tyohom-dyapa no Vale do Javari. Fonte: https://boletimisolados.trabalhoindigenista.org.br/2016/09/20/saude-e-dinamicas-de-ocupacao-territorial-dos-tyohom-dyapa-no-vale-do-javari/. Acesso: 20/09/16.
[14] Garimpo ilegal próximo a indígenas isolados é desmobilizado durante operação no Amazonas. Fonte: https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2019/09/13/garimpo-ilegal-proximo-a-indigenas-isolados-e-desmobilizado-durante-operacao-no-amazonas.ghtml. Acesso: 13/09/19.