O Estado peruano criou, no último dia 22 de maio, a Reserva Indígena Serra do Divisor Ocidental, com o objetivo de assegurar a proteção da vida, dos direitos e do território dos povos indígenas Remo ou Isconahua, Mayoruna (Matsés) e Kapanawa em situação de isolamento, que habitam a Amazônia peruana, na fronteira com o Brasil.
A criação da reserva implica em melhores condições legais para assegurar a existência e integridade desses povos, em um avanço na defesa de seus direitos coletivos em uma das regiões com maior concentração de povos isolados do mundo. O território é vizinho de diversas áreas protegidas com presença “confirmada” ou “em estudo” de povos isolados, e fica próximo do Parque Nacional da Serra do Divisor, no território brasileiro, no Acre.
Um projeto do governo brasileiro, de construção de uma rodovia ligando a cidade acreana de Cruzeiro do Sul a Pucallpa, no Peru, cortaria o Parque Nacional da Serra do Divisor, atravessando as áreas onde vivem indígenas isolados. No ano passado, uma sentença da Justiça Federal paralisou o licenciamento pela ausência de estudos de viabilidade técnica e de consulta aos povos indígenas afetados. A decisão também ordenou que fosse reconhecida a existência dos grupos isolados e que seus direitos sejam respeitados.
A Justiça também proibiu o Ibama de promover o licenciamento do trecho da BR-364 que já se encontra sob sua análise, enquanto não for realizada a mesma consulta aos povos indígenas e comunidades tradicionais, direta ou indiretamente, afetados pelo empreendimento bem como enquanto não for realizada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) a qualificação do estudo da Referência n. 64 – Isolados do Igarapé Tapada, com objetivo de confirmar a presença de povos indígenas isolados na região impactada pelo projeto.
O estudo de categorização que levou à criação da reserva peruana foi aprovado por maioria pela Comissão Multissetorial de Pueblos Indígenas en Aislamiento e Contacto Inicial (Piaci, na sigla em castelhano) em setembro de 2023. Após oito meses, o Estado peruano oficializou com o Decreto Supremo 004-2024 do Ministério da Cultura. É importante mencionar que no referido estudo foram incluídas mais de 300 evidências sobre a presença dos Piaci, provenientes de estudos ambientais, jurídicos e antropológicos, que incluem imagens de satélite, sobrevoos e trabalho de campo em comunidades vizinhas.
A nova reserva se estende entre os departamentos de Loreto e Ucayali, na fronteira com o Brasil, em uma área total de 515.114,7323 hectares. Neste território, agora protegido, não podem ser estabelecidos assentamentos populacionais e nem concedidos direitos para o aproveitamento econômico de recursos naturais. O Estado peruano deve garantir ainda a proteção contra invasões que poderiam afetar os modos de vida desses povos.
Com a categorização da Serra do Divisor Ocidental como nova reserva indígena, o Peru agora conta com oito reservas indígenas destinadas à proteção dos povos indígenas em isolamento e recente contato. Ainda persistem pendências em relação à obrigação do Estado de proteger esses povos.
Entre 1990 e 2003, foram estabelecidas as primeiras 5 reservas territoriais, enquanto as primeiras reservas indígenas categorizadas sob o regime estabelecido pela Lei Piaci foram criadas em 2021; ou seja, 15 anos após a entrada em vigor dessa normativa. Além disso, somente três anos depois, em 2024, foi categorizada a oitava reserva do país, após uma espera de quase vinte anos.
Essa demora causa a sobreposição de direitos em territórios de solicitações indígenas e o avanço da ilegalidade, com a ameaça que isso implica para os Piaci. Para que essas reservas cumpram seu objetivo, é necessário implementar postos de controle equipados e com agentes de proteção em seus principais acessos.
