Por: Fabrício F. Amorim
Em meados do mês de outubro de 2015 um grupo de homens matis localizaram na floresta e levaram para sua aldeia cinco crianças korubo. Esse episódio desencadeia o quarto “contato” com um grupo Korubo no Vale do Javari realizado pela Funai – os anteriores ocorreram em 1996 e em 2014 – e foi um dos desdobramentos recentes do processo histórico de interações entre os Matis, os Korubo e a política indigenista brasileira.
Os Korubo, povo falante de língua pano do ramo setentrional ou mayoruna[1] são historicamente conhecidos por sua resistência bélica às invasões e usurpação de seus territórios e dos recursos ambientais ali existentes. Em consequência de sua resistência, foram intensamente perseguidos ao longo das décadas de 1970, 1980 e 1990 (grande parte durante o período da ditadura militar).
Nesse processo de intensos embates, os grupos Korubo se submeteram a forçosos rearranjos sócio-territoriais, o que acarretou em conflitos entre a própria rede de parentesco korubo, fluxos migratórios e redução demográfica: é uma desconhecida diáspora no Brasil contemporâneo.
Em 2014, havia quatro grupos locais Korubo: um em situação de recente contato (o “grupo da Maya”, contatado em 1996) e três em situação de isolamento: o grupo do rio Coari; o grupo do rio Itaquaí; e o grupo do rio Curuena. Entre 2010 e 2014, a Funai, por meio da Frente de Proteção Etnoambiental Vale do Javari, investiu bastante em ações de localização de povos isolados na TI Vale do Javari, na tentativa de aumentar o conhecimento sobre a presença e dinâmicas de uso e ocupação desses povos, com o intuito de subsidiar estratégias de proteção. Foi nesse contexto que foi localizado pela Funai em 2010, pela primeira vez em mais de 20 anos, tapiris de isolados Korubo no rio Itaquai.
A expedição foi organizada em decorrência de denúncias de indígenas Kanamary – moradores do alto rio Itaquai – sobre um suposto ataque desferido por pescadores não indígenas, invasores, aos isolados Korubo na margem do Itaquai. Um indígena Kanamary havia ouvido, em um bar em Benjamin Constant/AM, um pescador bêbado se vaglorizar em ter matado isolados Korubo nesse rio. A expedição chegou, via fluvial, à região onde supostamente havia ocorrido o ataque, e iniciou uma cuidadosa caminhada:
Iniciamos uma inspeção em terra e logo vimos um caminho bem limpo dos isolados, alguns arbustos cortados a terçado, outros quebrados a mão, formando um caminho bem batido. Não haviam rastros novos, aparentemente os Korubo isolados não estavam ali naquele momento. Arriscamos uma entrada na mata, pelo varadouro deles, andamos passo a passo, devagar, atentos. Logo no início, vimos uma lança pontiaguda Korubo, feita de paxiuba, no meio do caminho, possível sinal para não prosseguir. Insistimos e prosseguimos, um silêncio mortal nos engolia. Uns 50 metros a frente avistamos, à distância, uma estrutura e palha que parecia ser um tapiri. Gelamos, pedi para a equipe parar a marcha, ouvir, ter certeza que não haveria ninguém ali. Aguardamos alguns minutos, nada ouvimos, certeza garantida, proseguimos devagar até o tapiri. Era um tapiri novo, com seis metros de cumprimento, coberto da cumeeira até o chão. Havia uma fogo apagado em um dos cantos do tapiri. Não havia quaisquer indícios de conflitos ou de qualquer outro problema. Felizmente, o ataque não se confirmou. Registramos todos os detalhes e retornamos. Nesse mesmo dia, localizamos outros dois sítios desse grupo isolado Korubo, em outros pontos na mesma região.[2]
Este texto trata-se, acima de tudo, de uma leitura sobre os processos de “isolamento” e “contato” de grupos Korubo na TI Vale do Javari. Os conceitos de “isolamento” ou “isolamento voluntário” estão em disputa e vem sendo alvo de críticas[3]. Muito há que se discutir para aprimorar ou definir a aplicação de conceitos antropológicos para as políticas públicas.
Apesar do termo “isolamento” sugerir um estado de não-relação com outros, não é nesse sentido que aqui ele é usado. Falaremos de “situação de isolamento” antes que de “indígenas isolados”, pois, em primeiro lugar, é preciso deixar claro que não se trata de um estado que definiria um grupo por sua “pureza” ou “essência” cultural preservada, por oposição a grupos que mantém contato com a sociedade ocidental. Tal visão evolucionista arraigada no senso-comum e muitas vezes presentes na mídia precisa ser de uma vez por todas descartada. O “isolamento” se refere a uma situação sociopolítica em que determinado coletivo indígena se encontra, definida por uma estratégia de relação com o entorno.[4]
Da mesma forma, a definição do que seria “contato” é alvo de debates tanto por parte de antropólogos e estudiosos do tema, como por parte de agentes do Estado e definidores de políticas públicas. Aqui o que chamaremos de “processo” ou “situação de contato” refere-se à atuação do órgão indigenista oficial. “Contato”, da forma aqui abordada, é o início de relações (não bélicas) de troca e comunicação contínua de um grupo indígena com os agentes do Estado.
Diáspora: a recente historia Korubo
São inúmeros os relatos de ataques e correrias perpetrados por madeireiros, pescadores e outros agentes não indígenas, contra os Korubo, entre as décadas de 1970, 1980 e 1990.[5] A região ocupada pelos Korubo nessa época – que abrange o interflúvio entre os rios Ituí e Itaquaí – era (e ainda é) rica em recursos madeireiros e pesqueiros.
Como se isso não bastasse, em meados da década de 1980, foram realizadas intensas pesquisas sísmicas por subsidiárias da Petrobras, na busca de jazidas de gás na região. Os Korubo reagiam à intervenção desses agentes sobre seus territórios e modos de vida. Era uma disputa de forças entre bordunas e armas de fogo (além das bombas e helicópteros das equipes de prospecção). Os Korubo se faziam temidos por seu domínio de táticas tradicionais de guerra, no entanto, as mortes que causavam em seus inimigos eram, certamente, em número muito menor que aquelas que sofriam.
A Funai fundou o primeiro posto para atrair os Korubo em 1972[6], em meio à franca invasão de madeireiros na região. Além das incursões madeireiras, estava em construção um trecho da Perimetral Norte que ligaria Benjamin Constant/AM a Cruzeiro do Sul/AC: era uma região de crescente tensão. Em 1974, nessa primeira tentativa de atração, foi morto um servidor da Funai e outro ficou gravemente ferido em ataque desferido pelos Korubo. Nos anos subsequentes foram feitas, por parte da Funai, outras duas investidas de atração dos Korubo, uma em 1975[7] e outra em 1982, todas resultando em ataques ao Posto de Atração e morte de servidores da Funai.
São doze massacres contra os povos indígenas isolados na região do Vale do Javari registrados documentalmente, ocorridos entre 1966 e 2001.[8] Há outros indícios que jamais foram registrados, a grande maioria perpetrados contra os isolados Korubo. Obviamente, não se sabe o número de mortes entre os indígenas não contatados, certamente expressivo. Por outro lado, no mesmo período, contabiliza-se pelo menos 40 não indígenas mortos pelos grupos em isolamento (a maior parte por golpes de borduna desferidos pelos Korubo). Entre esses, sete são servidores da Funai e dois servidores de subsidiárias da Petrobras.
Nesse processo de intensos embates, os grupos korubo se submeteram a forçosos rearranjos sócio-territoriais, o que acarretou em conflitos entre a própria rede de parentesco korubo, fluxos migratórios e redução demográfica: é uma desconhecida diáspora no Brasil contemporâneo. Podemos inferir por análises de imagens de satélite, pela documentação histórica e pelas ações de localização da Funai mais recentes[9], que até o início da década de 1970 os korubo se concentravam em uma região bem definida, entre os rios Itaquai e Itui (e interfllúvio dos baixos rio Branco e Coari). A partir dessa década, o aglomerado korubo fragmentou-se em grupos ainda menores, cada qual se reestabelecendo em regiões distintas[10]. Esse processo de migração forçada ocorreu até início da década de 2000, momento em que a Terra Indígena Vale do Javari foi regularizada e desocupada de invasores.
Os Matis: contato e resistência
O processo de interação dos Matis com a Funai iniciou-se em meados da década de 1970[11]. A Funai desencadeou a atração dos Matis também no contexto de construção do trecho da Perimetral Norte. Antes disso, os Matis já haviam estabelecido relações tanto pacíficas como conflituosas com seringueiros e madeireiros da região, o que contribuiu para rearranjos nas suas dinâmicas de ocupação[12]. No início da década de 1970, quando houveram os primeiros contatos com a Funai, a maior parte dos Matis vivia em cinco malocas distribuídas na região do alto Jacurapá, tributário da margem direita do rio Ituí (região que é próxima às cabeceiras do Coari e margem direita do Branco).[13]
A partir de 1982, em decorrência de um grave surto de gripe que dizimou grande parte de sua população (estima-se que dois terços), consequência do desastroso (não) atendimento da Funai no pós-contato, os Matis se concentraram nas proximidades do Posto Indígena de Atração (PIA) da Funai, no igarapé Bueiro, pequeno tributário do rio Itui. Deu-se então uma sedentarização e concentração forçada motivada pelas doenças. Os Matis passaram um período grande de luto e convalescência, onde deixaram de realizar importantes práticas tradicionais[14]. Gradualmente, nos anos subsequentes, o povo Matis foi retomando suas práticas e se fortalecendo. O período de convalescência ocorrido logo após o contato pesa, até hoje, nas decisões políticas do povo Matis.
O contato da Funai com um grupo Korubo em 1996
Em 1996[15] a Funai estabeleceu o contato com um dos grupos Korubo que então habitava a região de confluência entre o rio Itui e Quixito, não sem sofrer uma baixa. Em 1997 os Korubo matam pela última vez um funcionário da Funai, o sétimo. Os restantes grupos Korubo, localizados em outras regiões distantes, continuaram em “situação de isolamento”.
Entre o grupo contatado em 1996, constituído por um pouco mais de uma dezena de pessoas, havia uma mulher mais velha, Maya. Ela exercia (e ainda exerce) uma forte influência nas decisões políticas do grupo, por esse motivo ele é referido como o “grupo da Maya”, no intuito de distingui-los dos outros grupos Korubo. O grupo da Maya havia perdido uma parte considerável de seus cultivos ao longo dos anos de fuga, sendo um dos motivos de sua aproximação dos roçados de comunidades ribeirinhas não-indígenas, localizadas próximas à região onde se estabeleceram. Os ribeirinhos, com medo da presença dos Korubo, os atacaram, e essa situação justificou a intervenção de contato por parte da Funai. Pesava (e ainda pesa) por debaixo da pele de muitos indivíduos do grupo da Maya, fragmentos de chumbo, memória em forma de cicatrizes, que justificavam suas estratégias. O sertanista Rieli Franciscato foi o primeiro a investigar os massacres mais recentes praticados contra esse grupo, levantando a ocorrência de pelo menos dois: um em 1989, que já havia sido registrado[16], e outro em 1995, até então desconhecido[17]. Ambos perpetrados por não indígenas.
O contato de 1996 teve a importante participação dos Matis na condição de intérpretes. Apesar de não falarem a mesma língua, ambas são relativamente inteligíveis entre si.[18] A Frente de Contato Vale do Javari, na época liderada pelo sertanista Sidney Possuelo, optou pela ampla participação dos Matis no processo de contato com os Korubo por diversos motivos, especialmente pela proximidade territorial, linguistica e histórica entre eles. Os Matis contam que por volta das duas primeiras décadas do século XX, duas meninas korubo foram por eles capturadas, após um ataque a uma maloca korubo. Essas duas meninas mais tarde tornaram-se esposas de seus captores e geraram descendentes. Assim, alguns matis atualmente se consideram como parentes dos korubo.[19]
O envolvimento dos Matis nas atividades de atração do grupo Korubo contribuiu para o protagonismo e inserção do povo Matis na geo-política do Vale do Javari. A recuperação dos Matis (após catastrófico contato na década de 1970) estava a pleno vapor. A participação dos Matis no contato com o grupo da Maya permitiu aumentar a interação deles com o Estado, com a sociedade nacional, dar-lhes acesso mais direto às potencialidades emanadas por essas agências. Além disso, permitiu aos Matis o reestabelecimento de relações com os Korubo, grupo que do ponto de vista dos Matis fazem parte de sua formação como povo e com os quais estão conectados por relações de parentesco. Assim, após anos de convalescença e recuperação, o povo Matis se colocava num nível similar de expressão política no que tange à interação com o Estado, e em relação a outros povos indígenas do Vale do Javari.
O contínuo fortalecimento do povo Matis – 1998/2006
A partir do ano 2000, a Frente de Contato passou a ser denominada de Frente de Proteção Entoambiental Vale do Javari (FPEVJ)[20] sem, no entanto, modificar suas diretrizes de trabalho. A interação da FPEVJ com os Matis continuou ocorrendo a partir dos trabalhos irradiados pela Frente. Indígenas matis atuavam como colaboradores dos trabalhos, sobretudo no que diz respeito à interlocução com o grupo Korubo da Maya.
O período de recuperação demográfica e cultural dos Matis culmina, em 1998, na mudança dos Matis para uma nova aldeia na margem do rio Itui (Aurélio) e, em 2005, na formação de uma segunda aldeia (Beija Flor). Entretanto, a partir de 2003, as “doenças do branco” voltaram a assombrar o povo Matis: ocorre a crise das hepatites virais, colocando em risco todo o histórico de resistência e fortalecimento desse povo[21]. Como reação, os Matis adotaram uma série de estratégias, sendo uma delas a retomada dos territórios que ocupavam antes da primeira grande epidemia advinda do contato com a Funai. Assim, os Matis começaram a se fazer cada vez mais presentes em suas antigas áreas de ocupação, no rio Coari e Branco, por meio de atividades de caça e de coleta.
Segundo os próprios Matis, a retomada do uso e ocupação de lugares que foram obrigados a deixar de frequentar pela tragédia do pós contato está profundamente relacionada ao acesso ao Tatxik, cipó que usam para preparar uma bebida usada cotidianamente pelos homens.[22] The tatxik é farto nas regiões próximas ao rio Coari e Branco, inclusive no território dos Korubo isolados, no baixo rio Coari (grupo Korubo distinto do grupo da Maya). No rio Itui, onde se estabeleceram a partir de 1998, não havia taxkik. Para obtê-lo, os Matis faziam longas excursões, sobretudo no Coari e rio Negro (afluente do rio Itui – também área de ocupação de outro grupo isolado, os índios dos botões, ou Maiá).
Havia ainda outra via de acesso ao taxtik: os Korubo do grupo da Maya, que dispunham desses recursos na região onde se estabeleceram após o contato de 1996. Os Korubo também utilizam o taxik, de forma semelhante aos Matis[24]. Esses processos de troca são constituintes das relações entre os Matis e o grupo da Maya, que ocorriam no contexto do trabalho na Frente de Proteção, um exemplo das múltiplas e complexas relações em jogo.
Os outros grupos Korubo em isolamento – 2006/2014
Como já afirmamos acima, os conflitos ocorridos nas décadas de 70, 80 e 90 produziram uma série de migrações dos grupos Korubo. Em 2014, havia quatro grupos locais Korubo: um em situação de recente contato (o “grupo da Maya”) e três em situação de isolamento: o grupo do rio Coari; o grupo do rio Itaquaí; e o grupo do rio Curuena (este último permanece não-contatado). De inicio havia dúvidas se o grupo do Itaquai era o mesmo do Coari. Entretanto, em 2012, a Funai – por meio da FPEVJ, em ações de localização – concluiu tratar-se, de fato, de um grupo local distinto daquele localizado próximo ao Coari. Isso foi confirmado, posteriormente, pelos próprios indígenas Korubo do Itaquaí, contatados no final de 2014.
Vale registrar que esses grupos korubo em situação de isolamento são uma parcela do universo de povos isolados que ocupam várias regiões da TIVJ, povos de outras filiações linguísticas e com processos históricos e territoriais distintos. Entre 2010 e 2013, a Funai localizou 79[25] sítios[26] dos grupos isolados nessa TI. Só para se ter uma ideia, em apenas um sobrevoo realizado[27] em 2012, foram localizados e monitorados 21 malocas e 58 tapiris, distribuídos em 28 roçados, alguns desses derrubados pelos três grupos locais Korubo até então em situação de isolamento.
A tentativa de promover o diálogo qualificado com os Korubo – 2006/2014
Desde o contato com a Funai os korubo do grupo da Maya viviam uma crise permanente. Diminutos sob o ponto de vista populacional, com dificuldades de se casarem e terem filhos, haviam perdido ao longo de décadas de fuga anteriores ao contato com a Funai a possibilidade de manterem roças ou malocas, a não ser de forma intermitente. No ano de 2006 a FPEVJ iniciou um processo de promoção de direitos desse grupo. Foi contratado, em 2007, um linguista para estudar a língua Korubo, na tentativa de construção de um diálogo mais qualificado da Funai com o coletivo korubo. A partir daí alguns Korubo começaram a compreender e falar português e a equipe da Funai se esforçou em aprender a língua Korubo.
O grupo da Maya sempre expressou para os funcionários da Funai[28] sua vontade de contatar os restantes grupos Korubo, sobretudo o grupo do rio Itaquai pelo fato de possuírem com eles maior proximidade de parentesco. Essa vontade era muitas vezes justificada pelos korubo da Maya (inclusive pela própria Maya) pela necessidade de aumentar o número de mulheres entre os membros do grupo (que como foi dito, estavam em um contexto de inviabilidade de casamentos)[29]. Em 2011 chegaram a fazer uma tentativa de comunicação com o grupo do Coari, pela proximidade de acesso dessa região com suas aldeias (ambas na bacia do rio Itui). Essa tentativa acabou resultando em uma briga, com feridos em ambos os lados. O grupo da Maya realizou também excursões no interflúvio Itui e Itaquai na busca por vestígios dos korubo do grupo do Itaquai, chegando a localizar tapiris. Segundo contam, em uma dessas tentativas, avistaram os isolados mas não estabeleceram conversas com eles, ficaram apenas observando de forma furtiva. Em princípio, os Korubo do grupo da Maya escondiam da Funai essas investidas, já que a Funai se posicionava contrária a tais ações. Com o passar do tempo, gradualmente, foram revelando as tentativas de encontro com os Korubo em isolamento, sobretudo após a briga que houve com o grupo do Coari; após viagens conjuntas com a FPEVJ para localização de tapiris do grupo isolado do Itaquai; e expedições promovidas pela Coordenação Regional do Vale do Javari (CRVJ)[30] e FPEVJ, com a participação de indígenas Matis e Korubo às capoeiras antigas ao longo do rio Branco[31]. A partir dessas iniciativas, o diálogo da Funai com os Korubo ficou mais fluído.[32] Essa abertura do diálogo foi determinante no contato e pós contato que vieram a ocorrer, posteriormente, com os grupos do Itaquaí, em 2014, e do Coari, em 2015.
As retomadas Matis dos rios Coari e Branco– 2006/2015
Desde 2006 uma parte dos Matis que vivia na Aldeia Aurélio (no rio Itui, fundada em 1998), passaram a fazer uma roça na margem do rio Coari[33]. A partir de 2010 algumas famílias se mudam de forma permanente. Na época, a FPEVJ se manifestou contrária à essa mudança, por conta de proximidade do grupo korubo isolado do rio Coari[34]. Avaliava-se, na época, que essa maior proximidade poderia acarretar em disseminação de doenças aos isolados e ocorrência de conflitos (como acabou ocorrendo). Ainda assim, a Frente de Proteção compreendia a importância para o povo Matis da retomada de seus territórios ancestrais, como parte fundamental de seu processo de fortalecimento.
Em 2011, os Matis que haviam ficado na aldeia Aurélio e Beija Flor – no rio Itui – se mudam para o rio Branco. Apesar de novamente expor um posicionamento contrário a essa mudança, a Funai apoiou logisticamente a criação da nova aldeia, conforme suas atribuições regimentais. Era insustentável a permanência dos Matis no rio Itui em função de doenças, da escassez de caça, além do desejo dos Matis pela retomada de territórios que ocupavam antes da chegada e ataques dos não indígenas, até a déada de 1970. No entanto, apesar dessa ser uma área de ocupação antiga dos Matis, o grupo Korubo habitante do interflúvio do médio e baixo Coari e Branco (grupo do Coari) acabou por ocupá-la no decorrer dos quase 30 anos em que os Matis não frequentaram essa região (por imposição da situação trágica do pós-contato).
Contato com o grupo Korubo do Itaquai 2014
O contato com o grupo Korubo do Itaquaí ocorre em dois momentos. O primeiro no início de setembro [35] e o segundo em meados de outubro de 2014. O primeiro momento foi protagonizado por indígenas Kanamary, moradores do alto rio Itaquai. Enquanto se deslocavam numa canoa, os Kanamary avistaram um casal e crianças Korubo na margem do rio, próximo à sua aldeia denominada de Massapê. Os Kanamary pararam, tentaram estabelecer diálogos e os levaram para a aldeia. De imediato, deslocou-se para lá uma equipe da Funai[36] e Sesai[37], com intérpretes matis e korubo do grupo da Maya. O pequeno grupo korubo foi levado para a Base da Frente de Proteção e posteriormente para um outro ponto no rio Itui, próximo ao ponto em que vive hoje o grupo da Maya, onde permaneceram em quarentena e em tratamento médico. Esse grupo ficou conhecido como “grupo do Visa”, nome do homem adulto que havia entre eles. Na ocasião, Visa relatou que parte de seus parentes permanecia no Itaquaí, em situação de isolamento. Entre eles estaria a sua mãe. Afirmou ter havido mortes por doenças e que o restante grupo permanecia doente. Ainda segundo Visa, as mortes haviam motivado a migração deles para o alto Itaquaí, próximo às aldeias Kanamary, encontravam-se em grande instabilidade interna. A Funai, então, decidiu intervir com o intuito de diagnosticar o que de fato estava ocorrendo e avaliar a pertinência em se efetuar, ou não, o contato com o restante do grupo. A FPEVJ possuía conhecimento sobre a localização de sua malocas, tapiris e roçados. Foi realizadom um sobrevoo e descobriu-se que seu roçados estava de fato abandonados. No dia seguinte ao sobrevoo, os Kanamary da aldeia Massapê informaram, via rádio, que outros indivíduos isolados Korubo estavam próximos da aldeia. Uma equipe da Funai e Sesai deslocou-se para lá e confirmou a chegada de korubos nas imediações aldeia Kanamari. Foi convocada uma equipe formada por outros indigenistas e por intérpretes Korubo para tentar estabelecer diálogo com o grupo, diante do fato provável de estarem doentes. Mas entre o avistamento do grupo, e a chegada da equipe, os Korubo haviam partido.[38] Fabricio Amorim, que coordenou a equipe de contato registrou em seu caderno de campo o episódio:
Ligeiramente abaixo do primeiro avistamento, entramos na mata e localizamos um varadouro limpo deles. Caminhamos e logo encontramos um tapiri simples, novo. Nos acompanhavam dois indígenas do grupo da Maya e Visa. Eles gritavam, do jeito tradicional (I’e), chamava-os. Após várias tentativas sem resultado, ouvimos finalmente a resposta dos isolados, ao longe, em direção ao centro da mata. Demoraram um pouco, e finalmente se aproximaram, gritando da mesma forma. Recuamos e voltamos até a voadeira, amarramos o bote próximo à margem do rio, onde começava o caminho deles e esperamos. Após alguns (longos) minutos os Korubo isolados apareceram, correndo, pintados de urucum, desarmados, pularam no rio e nadaram até o bote, arrastando-o para a margem. Primeiro, surgiram só os adultos, entre eles a mãe do Visa. Gritavam, conversavam alto com os Korubo da Maya e com o Visa. Se havia tensão no primeiro momento, num segundo já estavam gargalhando, conversando alto e todos ao mesmo tempo, ao estilo Korubo. Apareceram algumas crianças e o ambiente pareceu ficar mais pacífico. Fizemos os primeiros procedimentos médicos[39] e, no dia seguinte, colhemos lâminas de malária de grande parte deles, resultando em 03 casos positivos: estavam de fato doentes, estavam morrendo. Constatamos que grande parte desse grupo ou era filh(a/o) ou net(a/o) da Maya. Inclusive, a mãe do Visa – Lalanvet – era filha da Maya. Obviamente ficaram surpresos com a existência da Maya, julgavam-na morta. Era um reencontro após, pelo menos, 30 anos.
Conflitos e contato entre os Matis e os Korubo isolados do Coari 2014/2015
No final de 2014 um pequeno número de indígenas korubo do grupo do rio Coari, formado apenas por homens, surge na roça da aldeia matis Todowak (constituída em 2010 no rio Coari), enquanto três matis iniciavam o plantio de milho. Conversaram, mas logo um clima de tensão se instalou. O ataque korubo ocorreu com o uso de galhos das árvores recém derrubadas. Um indígena matis conseguiu correr e sobreviver, mas infelizmente os outros dois não tiveram a mesma sorte.
Conjectura-se, a partir de relatos dos próprio Korubo do Coari, contatados no rio Branco, que logo antes do ataque houve um grave surto epidemiológico entre eles, afetando consideravelmente seu contingente populacional. Os sucessivos encontros que passaram a ocorrer no rio Coari, após a mudança dos Matis em 2010 contribuiu, provavelmente, para a ocorrência desse surto. É possível que as doenças tenham sido uma das mais importantes motivações do ataque Korubo aos Matis em 2014, conforme relatado pelos próprios Korubo.
O ataque korubo do final de 2014 foi um dos desdobramentos das interações que passaram a ocorrer de forma mais frequente na região do rio Coari após a mudança, em 2010, dos Matis para as margens desse rio. Outras inúmeras situações de contato e diálogo entre os Matis e Korubo ocorreram após 2010 no rio Coari, motivando a ida de equipes da Funai na aldeia Todowak (no Coari) para dialogar com as lideranças, encontrar soluções, com opinião da necessária mudança definitiva da aldeia, que só veio a se efetivar após a ocorrência do conflito.
Imediatamente logo após o conflito, uma equipe da Funai deslocou-se para a aldeia matis[40], estabeleceu novamente o diálogo, ocasião em que os Matis decidem evacuar a aldeia, transferindo-a para o rio Branco, próxima das outras duas aldeias Matis. Após o ataque e as mortes, os Matis pediram à Funai que realizasse o contato com o grupo korubo do Coari, como solução para o caso.
Em setembro de 2015, os Matis desencadeiam o processo de contato com os Korubo do Coari. O contato ocorre numa região entre duas comunidades matis no rio Branco. Os Matis encontraram um coxo[41] dos Korubo isolados encostado na margem do rio e, a partir de onde estava o coxo, seguiram o rastro deles, até encontrarem crianças korubo. As crianças estavam no local coletando frutos, enquanto os adultos seguiam mais adiante. As crianças são levadas para a aldeia matis (Tawaya) enquanto outro grupo de homens matis permanece no caminho aguardando o retorno dos adultos korubo. Estes, ao perceberem a ausência das crianças, retornam e encontram os Matis. As crianças, bem como os adultos, são levados para um acampamento feito pelos Matis na margem do rio Branco. Logo após esse episódio a Funai[42] interviu e assumiu, em conjunto com a Sesai, a interlocução do contato, iniciando a operacionalização do plano de contingência[43]. Cerca de duas semanas depois desse contato, os Matis encontraram um segundo grupo Korubo, constituído por 10 pessoas, que permanecia nas redondezas, levando-os ao encontro dos outros recém contatados.
Com os relatos dos Korubo do Coari recolhidos pela equipe da Funai durante as ações de pós contato, toma-se conhecimento de surtos epidemiológicos recentes ocorridos entre eles. Os Korubo do Coari relataram, ainda, para a equipe da Funai o revide levado a cabo pelos Matis, logo na sequência do conflito na roça da aldeia Todowak no fim de 2014, que causou a morte de vários korubo.
Essa situação de contato resultou em uma divergência entre os Matis e a equipe da Funai. Um dos principais motivos da insatisfação Matis ocorreu pelo posterior deslocamento dos Korubo promovido pela Funai: do rio Branco (local onde ocorreu o contato, próximo às aldeias Matis) para um outro local próximo às áreas onde vivem atualmente os outros grupos Korubo, contatados em 1996 e 2014. Apesar da discordância dos Matis, o deslocamento promovido pela Funai do grupo do Coari teve como fundamento a decisão dos próprios Korubo de não permanecerem no local – eles ainda temiam outros ataques dos Matis – e a integridade física e epidemiológica deles.
Além disso, segundo os Matis[44], foi o deslocamento do grupo Korubo do Itaquaí, contatado em 2014, para a mesma região no rio Itui, que motivou os Korubo do Coari a efetuarem o contato no mesmo ano. Para os Matis, os Korubo do Coari procuravam seus parentes do Itaquai (o grupo do Visa) no local em que foram encontrados pelos Kanamari, mas não os encontraram, responsabilizando os Matis por esse desaparecimento. Essa versão não foi confirmada pelos próprios Korubo, no entanto, ainda é necessário que se qualifique melhor o diálogo com os recém-contatados para que tenhamos maior clareza sobre o que motivou o conflito.
Os protocolos estabelecidos nos contatos de 2014 e 2015
Ambos os contatos, o de 2014 e o de 2015, foram organizados por meio de protocolos e extensas regras de trabalho, o que contribuiu determinantemente para a não ocorrência de quaisquer situações tensas ou conflituosas no pós contato. A participação indígena, inclusive de representantes do grupo Korubo contatado em 1996, foi fundamental para a organização dos protocolos e cumprimento dos objetivos da equipe.
A equipe que participou das ações de pós contato com o grupo Korubo no rio Branco, em 2015, foi regida por rígidos protocolos, estabelecidos pela própria equipe a partir de experiências anteriores (documentadas) de contatos no Vale do Javari – notadamente o contato com o grupo da Maya, em 1996 – e das experiências de trabalho dos integrantes na FPE Vale do Javari e junto aos povos indígenas da região. A necessidade de estabelecer uma extensa lista de cuidados e protocolos foi em decorrência da situação de extrema tensão que havia se instalado e do histórico de tentativas frustradas de contato da Funai ao longo das décadas de 1970 e 1980, que culminou em conflitos e mortes.
O acampamento da equipe de pós contato era distinto do acampamento onde ficavam os tapiris dos Korubo, localizado no outro lado do rio, a cerca de 100 metros de distância. Os protocolos foram divididos em três eixos: a) protocolos no acampamento da equipe; b) protocolos no acampamento Korubo, e c) protocolos de saúde e prevenção epidemiológica.
Os protocolos estabelecidos no acampamento da equipe incluíram desde a definição de planos de contingência no caso de aparecimento de outros indígenas isolados, até regras de segurança, tal como a limpeza e aumento de visibilidade ao redor do acampamento, excursões rotineiras no entorno, proibição de uso de moto serra (em função dos históricos embates entre os Korubo e madeireiros), e procedimentos do sistema de comunicação e logística.
Os protocolos e orientações definidos para serem aplicados no acampamento Korubo, incluíram desde definição de equipe mínima para visita aos Korubo (não era recomendável a ida de um número inferior ao de homens Korubo), orientações para posturas tranquilas e atentas, proibição do porte de armas, cuidados de registro audiovisual, rígidas regras e controle de distribuição ou troca de objetos ou alimentação, entre outros.
Os protocolos de saúde e prevenção epidemiológica contemplaram o uso obrigatório de máscaras cirúrgicas, a higienização das mãos antes e depois da realização as visitas aos Korubo e cuidados sanitários no acampamento da equipe. Havia um pequeno acampamento de equipe separado do principal, onde ficavam em quarentena e observação os novos integrantes que chegavam. Havia uma constante e atenta vigilância epidemiológica por parte da equipe junto aos Korubo. A participação feminina, por meio da enfermeira Luziane Silva, foi fundamental na reversão de quadros epidemiológicos, diminuindo o nível de desconfiança do grupo Korubo com relação à nossa equipe, bem como proporcionando maior acesso às crianças menores e mulheres. O atendimento médico era considerado prioritário. Só após o término dos procedimentos médicos é que a equipe sentava com os Korubo e dialogava, no esforço de compreender e qualificar as circunstâncias daquele contexto e os anseios e decisões dos próprios Korubo.
Portanto, ao contrário do que se fala de forma desinformada no meio acadêmico e jornalístico, no que tange à pratica de contato e pós contato empreendida pela equipe, os trabalhos foram envoltos de sistemáticas e rígidas regras e protocolos. Tais protocolos foram construídos em conjunto com a equipe indígena. Não fosse essa rígida organização, os resultados teriam sido muito piores. Não houve, nos contatos e pós contatos de 2014 e 2015 quaisquer mortes, seja por parte do grupo Korubo ou da equipe (diferente do que ocorreu no contato de 1996, por exemplo). As decisões foram tomadas com base em exaustivo diálogo com os Korubo, com os Matis e com os próprios indígenas integrantes da equipe.
A precarização da Frente de Proteção Etnoambiental Vale do Javari
A precarização das condições e estrutura de trabalho da FPE Vale do Javari (FPEVJ), localizada no Amazonas, na fronteira com o Peru; a evasão de servidores do quadro após concurso público de 2010, pelas dificuldades inerentes de um trabalho permanente de campo e falta de regulamentação para tal; e o término de contrato terceirizado (justamente por conta do concurso público de 2010) acarretaram, em 2012, na desativação da Base do rio Jandiatuba, localizada na região com maior concentração de povos isolados da TI Vale do Javari. Embora localizada numa região distinta da ocupada pelos então grupos isolados Korubo, esse fechamento refletiu as dificuldades de operacionalização da FPEVJ, que optou em concentrar, a partir de 2012, os trabalhos na região ocupada pelos grupos Korubo isolados, nas bacias dos rios Ituí e Itaquaí.
Era um período onde as invasões na calha do rio Itaquaí e Ituí aumentavam consideravelmente. As invasões são promovidas, especialmente, pela rede criminosa de pesca ilegal de pirarucu. Fica claro, ao nosso ver, que a precarização e impossibilidade da FPEVJ em manter a sistemática de vigilância e uma constante presença nas aldeias Matis contribuíram, também, para esse trágico cenário.
Pelo menos desde 2013 os coordenadores das FPE alertam sobre a gradual precarização das condições estruturais das FPE, o sucateamento geral da política pública e as consequências disso no aumento da vulnerabilidade dos povos isolados e de recente contato, colocando “o Estado brasileiro em situação de flagrante violação de direitos indígenas”. [45] Tais alertas vieram a se confirmar em 2014 e 2015, período em que ocorreu uma série de contatos e conflitos envolvendo povos isolados. A fragilização se intensificou nos últimos dois anos, não só da FPEVJ, mas de todas a política direcionada aos povos indígenas isolados. Continuando esse cenário, a tendência é a ocorrência de outros conflitos, contatos e mortes.
Algumas lições
As situações de “contato” e “isolamento” que aqui apresentamos brevemente, explicitam a necessidade de uma séria discussão sobre o respeito à autonomia e direitos dos povos indígenas em tais situações, pois nelas estão em jogo a autonomia e os direitos de dois (ou mais) povos que possuem entre si complexas relações e diferentes perspectivas sobre tais relações. A visão que os Matis tem da relação com os Korubo não é necessariamente a mesma que os Korubo tem dessa relação, e ainda está por ser constituídos mecanismos eficientes de consulta, diálogo e tomadas de decisão conjunta pelos Matis, Korubo e Funai.
Além de ações eficazes de proteção e vigilância dos territórios ocupados pelos indígenas em isolamento, da institucionalização e aprimoramento de planos de contingência em casos de contato, e do desenvolvimento de mecanismos cada vez mais qualificados de diálogo[46] e consulta junto aos povos indígenas que vivem em contextos semelhantes – ou seja, de interações com povos isolados – é necessário que a Funai, por meio das Frentes de Proteção Etnoambiental, tenha condições de operar tais ações. Isso traduz-se no efetivo fortalecimento dessas unidades descentralizadas, permitindo a presença e acompanhamento constante das equipes em campo, tanto nas expedições de localização e monitoramento das dinâmicas de ocupação dos isolados, quanto nas aldeias de povos que vivem próximos dessas regiões. Outras situações como essas estão ocorrendo, tal como no Acre, Rondônia e no próprio Vale do Javari[47]. O fortalecimento da política pública, por meio da disponibilização de recursos humanos, capacitação, além dos recursos orçamentários e logísticos necessários, são indispensáveis para lidar com esses contextos. O problema não está no direcionamento da política pública atualmente adotada pelo Estado brasileiro[48] e sim no atual enfraquecimento dessa mesma política: na atual incapacidade administrativa das Frente de Proteção desenvolverem suas ações de forma plena[49].
Nota de agradecimento: Agradeço os comentários da antropóloga Beatriz A. Matos, autora do recente Diagnóstico Participativo do Uso do Território dos Rios Coari e Branco pelo Povo Matis (2015), elaborado no âmbito da parceria Funai/Pnud. Agradeço também ao indigenista Bruno Pereira, pelas discussões que culminaram neste texto. Pereira participou, também, das ações de pós contato em 2015.
CONDE, Ananda: https://pib.socioambiental.org/pt/povo/korubo
[1] FLECK, D. Panoan Languages and Linguistics. New York: American Museum of Natural History. 2013; OLIVEIRA, S. Preliminares sobre a Fonética e Fonologia da Língua Falada pelo Primeiro Grupo de Índios Korubo Recém-Contatados. Dissertação de Mestrado em Linguística. Brasília: Universidade de Brasília, 2009.
[2] Trecho adaptado do diário de campo de Fabrício Amorim, que na época estava como coordenador da FPEVJ.
[3] Ver por exemplo:
GALLOIS, D. De arredio a isolado: perspectivas de autonomia para os povos indígenas recém-contactados. In: GRUPIONI, L. (Org.) Índios no Brasil. MEC, 1992.;
OCTAVIO, C. R. & AZANHA, G. Isolados – algumas questões para reflexão. CTI, 2009;
GOW, P. “Me deixa em paz!” Um relato etnográfico preliminar sobre o isolamento voluntário dos Mashco. Revista de Antropologia. São Paulo, USP, 2011. V. 54 No 1. 11-46.
HUERTAS, B. Despojo territorial, conflict social y exterminio: pueblos indigenas en situación de aislamiento, contacto esporádico y contacto inicial de la Amazonia peruana. Informe IWGIA 9. IWGIA, 2010.
SHEPARD, G. Ceci N’est Pas un Contacte: the Fetishization of Isolated Indigenous People Along the Peru-Brazil Border. Tipití: Journal of the society fot the Anthropology of Lowland South America. Vol. 14: Iss1, 135-137. 2016.
MILANEZ, F. & SHEPARD, G. The Few Remaining: Genocide Survivors and the Brasizlian State. Tipití: Journal of the society fot the Anthropology of Lowland South America. Vol. 14: Iss1, 131-134. 2016.
[4] Como afirma Huertas: En efecto,como se ha visto, en algunos casos se trata de pueblos, en la mayoría, de segmentos remanentes de éstos que como consecuencia de procesos regionales han asumido el aislamiento como tipo de relación con el entorno. (HUERTAS, B. op. cit.). Ver também conceito da ONU (ACNUDH, 2012), in: ACNUDH. Directrices de protección para los pueblos indígenas en aislamiento y en contacto inicial de la region amazónica, em gran Chaco y la región oriental de Paraguay, ONU, 2012.
[5] COUTINHO, 1998. (RCID TIVJ)
[6] COSTA, Sebastião Amâncio da. Relatório de Atividades do PIA Marubo no periodo de 16/11/72 a 02/02/73. Funai, 1973.
[7] Seis grupos tribais já contatados na Perimetral Norte. Boletim Informativo, Brasília:Funai, v. 14, n.4, p. 57-61, 1975.
[8] Cronologia de conflitos. Departamento de Índios Isolados (DEII)/Funai, 1997.
[9] Trata-se de metodolgia já utilizada e consoliada pelo Estado brasileiro, de localização de grupos isolados.
[10] AMORIM, Fabrício. Relatório de viagens à aldeia Matis (Todoak) no rio Coari. (2012-2013). (p. 22 “Dinâmica de ocupação Korubo”). Funai, 2014.
[11] FUNAI. Uapá: cachorros facilitam a atração. Revista de Atualidade Indígena, Ano II, n°8, Jan/Fev, 1978. P. 16
[12] Os matis contam que no início do século XX sofreram ataques de seringueiros, inclusive com rapto de crianças e mulheres matis. Esses seringueiros teriam vindo do baixo rio Branco. Há registro, inclusive fotográficos, de um seringal cuja sede se localizava em 1910 na confluência do Itaquaí com o Branco. (MATOS, B. Diagnóstico Participativo do Uso do Território dos Rios Coari e Branco pelo Povo Matis. FUNAI/PNUD, 2015.)
[13] Matos, 2015 op. cit.
[14] NASCIMENTO, H. e ERIKSON, P. Desastre Sanitário (Matis). In: RICARDO B., RICARDO, F. (Eds.) Povos Indígenas no Brasil 2001/2005. São Paulo: Instituto Socioambiental. 446-448. 2006.
[15] POSSUELO, Sidney. Informação n. 001/COORD FCVJ/DII. Funai, 1996.
[16] PINHEIRO. Jaime Maciel. Relatório da viagem e registro de ocorrência. Funai, 1989.
[17] FRANCISCATO, Rieli. Relatório sobre massacre de índios Korubo, ocorrido em 1995. Funai, 2000.
[18] Além da língua Matis, a língua Matses (Mayoruna) também é bastante próxima daquela falada pelos Korubo. Conferir FLECK, 2013. Op. cit.
[19] Segundo levantado no Diagnóstico (MATOS, 2015 op. cit.), os Matis capturaram as meninas korubo em uma maloca localizada entre as cabeceiras dos igarapés Todowak e Bukuak, no interflúvio entre o baixo Coari e o baixo Branco. Sobre as relações Matis-Korubo ver também ERIKSON, P. La Griffe des Aïeux. Paris: Peeters.1996; e ARISI, Barbara. Matis e Korubo: contato e índios isolados no Vale do Javari, Amazônia. Dissertação de Mestrado em Antropologia Social. Florianópolis: Universidade Federal deSanta Catarina. UFSC. 2007.
[20] As Frentes de Proteção Etnoambiental são unidades descentralizadas da Funai, responsáveis pela implementação da política indigenista direcionada aos povos indígenas isolados e de recente contatados. Existem atualmente 12 Frentes em operação.
[21] Nascimento, Hilton S. & Erikson, Philippe. Matis: desastre sanitário. In: Povos Indígenas no Brasil 2001/2005. ISA, 2005. Sobre a crise de hepatites no Vale do Javari ver Coutinho Jr, W. Hepatopatias No Vale Do Javari: Virulento Agravo À Saúde Indígena e Afronta aos Direitos Humanos. Relatório. Manaus: Ministério Público Federal, Procuradoria da República no Amazonas. 2008
[22] A prática de beber tatxik é também fundamental para o xamanismo matis. Além dos rituais de tatuagem e outros, práticas xamânicas foram reavivadas pelos Matis nas duas últimas décadas. Sobre o uso do cipó tatxik, e o reavivamento recente de práticas xamânicas matis conferir: MATOS, B. Op. Cit.; ARISI. B. A Dádiva, a Sovinice e a Beleza: Economia da cultura Matis, Vale do Javarí, Amazônia. Tese de Doutorado em Antropologia Social. Florianópolis: UniversidadeFederal de Santa Catarina. UFSC. 2011.
[23] FUNAI. Atração pelos botões. In: Revista de Atualidade Indígena, ano II, n°11, Jul/Ago, 1978, p.2.
[24] Os Matses também utilizam o tatxik (Ver MATOS, B. A visita dos espíritos: ritual, história e transformação entre os Matses da Amazônia Brasileira. Tese de Doutorado em Antropologia Social. Museu Nacional, UFRJ. 2014).
[25] Conforme relatórios produzidos por Fabrício Amorim entre 2010 e 2013.
[26] “Sítio”, conforme metodologia de sistematização empregada pela FPEVJ/Funai, trata-se de um conjunto de vestígios que caracterizam a ocupação de um grupo indígena isolado. Um local onde há um conjunto relacionados entre si de roçado(s), maloca(s) e/ou Tapiri(s), que indicam tratar-se de um grupo local, pode ser considerado um “sítio.” O conceito é bastante semelhante ao utilizado pela arqueologia.
[27] AMORIM, Fabrício. Relatório do sobrevoo de fevereiro de 2012. Funai, 2012.
[28] Amorim, um dos autores desse texto, atuou na frente de proteção entre 2006 a 2014 e pode ouvir inúmeras vezes tais relatos.
[29] Um estudo etnológico com os Korubo ainda está por ser feito mas é provável que, tal como os Matses, os Korubo tenham a tendência de residência patrilocal após o casamento.
[30] A CRVJ é uma das unidades descentralizada da Funai que trata da execução regional da política indigenista. No caso, Bruno Pereira era o coordenador na época. Durante sua gestão apoiou constantemente o trabalho da FPEVJ e investiu bastante no diálogo com o entorno indígena dos povos isolados.
[31] GÓIS, V. Relatório de Diagnóstico Etnoambiental. Expedição de Monitoramento Ambiental e Territorial no Rio Branco com os Povos Matis e Korubo. FUNAI-CGIIRC. 2014.
[32] Ver filme: Korubo: uma etnia entre fronteiras (2013). Direção: Mariana Fagundes, Luís Abramo e Ernesto Solis. (Desenvolvido pela Noctua em parceria com a IWGIA). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=yZOoY7kBKks ou http://noctua.art.br/projeto/korubo-uma-etnia-entre-fronteiras/
[33] ARISI, 2007 op. cit e Matos, 2015 op. cit.
[34] AMORIM, Fabrício. Memorando 129/2010 – FPEVJ. Funai, 2010.
[35] http://www.funai.gov.br/index.php/comunicacao/noticias/3040-grupo-isolado-korubo-faz-contato
[36] Leonardo Lenin, na época coordenador de Proteção e Localização de Índios Isolados (COPLII/Funai-sede) e o coordenador da FPEVJ, Beto Marubo, coordenaram os primeiros atendimentos a esse grupo.
[37] Secretaria Especial de Saúde Indígena, órgão do Ministério da Saúde responsável pelo atendimento médico.
[38] AMORIM, Fabrício. Relatório sobre contato estabelecido com um grupo indígena isolado da etnia Korubo, no rio Itaquaí. Funai, 2014.
[39] Um medico da Sesai integrava a equipe, dr. Luiz Roman, médico cubano do Programa Mais Médicos, que com muita competência conseguiu avaliar todos nesse primeiro momento. Posteriormente assumiu o médico dr. Lucas Albertoni que, em conjunto com a enfermeira Luziane Silva, foram fundamentais na garantia de sobrevivência desse grupo, salvaram vidas em meio a ocorrência de sucessivos surtos epidemiológicos.
[40] Logo após conflito, uma equipe da Funai coordenada pelo chefe da FPEVJ, Beto Marubo e pelo coordenador da CRVJ, Bruno Pereira, se desloca para a região.
[41] Uma espécie de canoa rústica, feita a partir de o tronco cavado de uma palmeira (paxiuba).
[42] O Coordenador da FPEVJ, Eriverto Vargas (Beto Marubo), e o Coordenador da CRVJ, Bruno Pereira, coordenaram o início das atividades de pós contato, Beto Marubo atuando no diálogo com os Korubo e operacionalização do acampamento da Funai e Pereira junto aos Matis, conforme suas atribuições regimentais. Posteriormente, Fabrício Amorim assume a coordenação do trabalho, sempre em conjunto com equipe médica da SESAI (em específico os médicos dr. Lucas Albertoni, dr. Luís Roman, em conjunto da enfermeira Luziane Silva, que participaram ativamente nas decisões no âmbito das ações de pós contato)
[43] A metodologia empregada durante o plano de continência – que incluiu diálogo com os matis – foram um reflexo do aprimoramento metodológico para lidar com situações de contato. Foi, sem dúvida, sob o ponto de vista metodológico, a ação de pós contato mais organizada e envolta de inúmeros protocolos de saúde e indigenistas, isso em comparação com os contatos anteriores ocorridos em 2014 no Acre e no Maranhão.
[44] AIMA (Associação Indígena Matis). Carta n. 11/AIMA/15. 2015.
[45] Carta dos Coordenadores de FPE de 2013.
[46] Nesse sentido, em 2010, a FPEVJ idealizou o projeto Maë Xeni (roças antigas) junto aos Matis, como proposta de aprimorar o diálogo e discussão com eles sobre suas antigas e atuais dinâmicas de uso e ocupação. (AMORIM, Fabrício & COELHO, Vicente. Os Matis no rio Coari, area de índios isolados Korubo: relatos de viagem e proposta de trabalho. Funai, 2010.)
[47] AMORIM, Fabrício & CONDE, Ananda. Situações de Contato e Isolamento no Vale do Javari. In: Povos Indígenas no Brasil 2006/2010. ISA, 2011. P.375
[48][47] Ver “Carta aberta dos servidores da CGIIRC/FPE”In: http://www.funai.gov.br/index.php/comunicacao/noticias/3809-funai-realiza-encontro-de-servidores-para-debater-politica-de-protecao-e-promocao-dos-direitos-dos-povos-indigenas-isolados-e-recem-contatados
[49] AMORIM, Fabricio & COELHO, Vicente. Índios Isolados e Contatados da TI Vale do Javari: notas para uma gestão territorial compartilhada: O caso Matis e os isolados Korubo. FPEVJ/Funai, 2011.